Conhecimento
Ciência ajuda a aproveitar lodo de tratamento de água na agricultura
Trabalho de pesquisadores da Embrapa e de outras instituições geraram dados para uso seguro nos solos
Foto: Divulgação - DP - Lodo mostrou-se capaz de incrementar matéria orgânica nas áreas aplicadas
Estudo coordenado pela Embrapa Clima Temperado e realizado por especialistas de diversas instituições gerou dados e estabeleceu procedimentos para o emprego seguro do lodo de estações de tratamento de água (Leta) em solos agrícolas. O trabalho científico subsidiou a elaboração da Resolução Normativa nº 461/2022, do Conselho Estadual de Meio Ambiente (Consema-RS), a primeira relacionada ao uso desse tipo de resíduo. O Leta é um grande problema de destinação para as companhias de saneamento e costuma ser disposto somente em aterros sanitários.
Participaram da pesquisa profissionais da Embrapa, UFPel, Furg e Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) com o apoio da Corsan e o acompanhamento da Fundação Estadual de Proteção Ambiental (Fepam-RS) e do Ministério Público Estadual.
A pesquisa mostrou que, se devidamente tratados, os Letas podem condicionar solos agrícolas arenosos e que, sob diversas condições de aplicação, preservam a qualidade do solo e até promoveram pequenos aumentos da produtividade de lavouras experimentais de milho e azevém, em circunstâncias específicas. Além disso, quando utilizados na formulação de substratos, apresentaram benefícios como incremento de altura, de volume radicular e precocidade.
“Os lodos de estações de tratamento de água eram considerados um passivo; agora são convertidos em matérias-primas para fabricação de insumos e produtos para uso seguro na agricultura”, ressalta o gestor do Departamento de Inovação Tecnológica da Corsan, Jonas Kneip Araújo.
A Corsan atende 317 municípios gaúchos e produz aproximadamente 51 mil m3 de lodos de estações de tratamento de água e cerca de 32 mil m3 de lodos de estações de tratamento de esgoto, anualmente.
Resultados dos estudos
Os especialistas contam que a geração dos Letas tende a aumentar, no mínimo, em uma taxa proporcional ao crescimento da população humana. “Por isso, é urgente a introdução de novas soluções para sua destinação segura e eficiente”, defende o pesquisador Adilson Bamberg, da Embrapa, que coordenou o estudo.
A pesquisa mostrou que os Letas são resíduos constituídos, predominantemente, de partículas naturais de silte, argila e matéria orgânica presentes na água bruta captada de rios, lagos, barragens e poços. As partículas são removidas por meio de tecnologias tradicionais como a floculação, a decantação e a remoção com filtros para obtenção da água tratada e os resíduos podem ser aplicados em solos de forma segura. “Os Letas avaliados não apresentaram concentrações significativas de metais pesados, organismos patogênicos nem contaminantes orgânicos, não sendo potencial fonte de risco para o meio ambiente”, conta a pesquisadora Rosane Martinazzo, da Embrapa.
Os solos brasileiros são, em sua predominância, ácidos, com pH menor que 6 e naturalmente pobres em nutrientes, apresentando concentrações significativas de elementos como alumínio, ferro e manganês. “Quando aplicados aos solos, os Letas podem apresentar concentrações de alumínio, ferro e manganês em níveis que vão limitar o pleno desenvolvimento das culturas agrícolas”, ressalta Bamberg. Ele explica que isso ocorre devido à origem dos lodos e a fatores naturais, mas também ao processo de tratamento com agente floculante à base de sulfato de alumínio, sem um processo de correção de pH. Ou seja, o dano deve-se em parte ao tratamento aplicado e, principalmente, à origem dos sedimentos, que chegam aos mananciais pela erosão dos solos e por fatores naturais. “No entanto, isso não impossibilita a destinação dos Letas em solos de forma adequada, desde que acompanhada também da costumeira correção da acidez do solo”, pondera.
O uso de Letas tem se mostrado promissor em solos de textura arenosa e de áreas degradadas. Apesar de não aportar quantidades significativas de nutrientes para as plantas, os Letas têm potencial de incrementar o teor de matéria orgânica e a aplicação pode trazer benefícios por meio da melhoria da agregação, da retenção de água e de nutrientes em solos mais frágeis.
“Outra possibilidade para os Letas é a sua utilização como matéria-prima para substratos às plantas, em combinação com os materiais comumente utilizados neste tipo de produto”, afirma Martinazzo. A pesquisadora, a doutoranda Mariana Teixeira da Silva, o pesquisador Sérgio dos Anjos e Silva, da Embrapa, e a pesquisadora Maria Helena Firmino, do Departamento de Diagnóstico e Pesquisa Agropecuária, antiga Fepagro, desenvolveram estudos utilizando diferentes proporções de lodo de estação de tratamento de esgoto (Lete), lodo de estação de tratamento de água (Leta), cinza de casca de arroz e vermiculita. Os substratos à base de Lete apresentaram desempenho agronômico similar ou superior ao substrato comercial utilizado como referência. O Leta teve como principal destaque a elevada capacidade de troca de cátions, porém a formulação do substrato contendo essa matéria-prima ainda requer ajustes quanto à granulometria e proporção na mistura, o que será definido em estudos futuros.
Próximos passos
A pesquisa busca agora a geração de novos produtos derivados de Letas e a validação de insumos avaliados no âmbito da parceria conduzida por meio do Termo de Cooperação Embrapa-Corsan, especialmente os substratos para plantas. O trabalho também deve originar outros produtos, podendo ser classificados como insumos agropecuários: condicionador de solos arenosos à base de Letas; e substratos para plantas à base de Letas, com formulações eficientes e seguras, ajustadas para diferentes espécies vegetais.
Carregando matéria
Conteúdo exclusivo!
Somente assinantes podem visualizar este conteúdo
clique aqui para verificar os planos disponíveis
Já sou assinante
Deixe seu comentário