Palco
Peça 'O homem e a mancha' volta a Pelotas neste domingo
Obra de Caio Fernando Abreu, escrita há 30 anos e apresentada na cidade em 1997, recebe uma nova montagem com recursos tecnológicos
Foto: Gilberto Perin - Especial DP - No palco, Marcos Breta contracena com ele mesmo, nos anos 1990, com auxílio da tecnologia
Pelotas volta a receber neste domingo o espetáculo teatral O homem e a mancha: multimídia, uma releitura da peça homônima de 1996 - mas escrita há 30 anos - com texto de Caio Fernando Abreu. Promovida pelo Sesc/RS, a apresentação acontece às 20h, no Teatro Sicredi. Com recursos multimídia, o monólogo é estrelado pelo ator Marcos Breda, o mesmo da montagem original, e que contracena com ele, com o autor e com leituras das diferentes montagens, a partir da tecnologia. O artista revive e, ao mesmo tempo, dialoga com o personagem dos anos 1990 enquanto transita entre a história de cinco diferentes personagens.
“São cinco níveis de leitura no palco, com a combinação de quatro vídeos de 94, 96, 97 e 2021. Essa combinação que dá O homem e a mancha de 2023”, ressaltou Breda. O público vai conhecer um ator desmemoriado à procura de um personagem, um aposentado solitário, um homem obcecado por uma mancha na pele, e Dom Quixote. Na ótica do ator, os personagens espelham as principais obsessões éticas, estéticas, filosóficas e existenciais de Caio Abreu. Um exemplo é o idoso, servidor público que depois de se aposentar virou ermitão -, e que atualmente teme pelo desamparo e a solidão. “O personagem está farto de lidar com a aspereza do mundo, com a grosseria e todas as agruras que a vida vinha impondo a ele, ou que ele vinha se expondo. O fato é que esse idoso é nada mais do que uma das obsessões do próprio Caio que tinha a maior dificuldade para poder lidar com as coisas do dia a dia, bancos, supermercado e tal”, comenta o artista.
Breda cita ainda o paciente de uma sessão de psicanálise atormentado por uma mancha que ele teria em algum lugar do corpo, que é uma lógica alusão à Aids na época, e que acabou sendo a doença que vitimou o próprio Abreu. O ator explica que, felizmente, não é a mesma mancha de 1993 (quando o texto foi escrito) e que sentencia a morte. No entanto, pode ser uma metáfora de toda e qualquer doença incurável, que mais do que vitimização, a pessoa fisicamente vai corroendo psicologicamente sem que se tenha consciência disso.
Por fim, Dom Quixote. “É a metáfora do sonhador. Aquele personagem do Cervantes que almeja um mundo de mais nobreza de menos grosseria e os ideais de cavalaria que ele tem como obsessão para restaurar uma nova idade de ouro na terra, e que era também uma das obsessões do Caio: um mundo mais nobre, mais digno, mais solitário e com mais compaixão.” Dom Quixote é apresentado no início da sua trajetória e no final dela quando ele é finalmente derrotado. “Um sonhador que não consegue lidar com a realidade objetiva, ele é continuamente derrotado, e isso daria origem a um personagem fundamentalmente tragicômico. E nisso reside a grandeza desse texto e desses personagens”, conceituou.
O monólogo, segundo o ator, além de atemporal, fala de todo ser humano, em qualquer lugar do mundo, movido pelas mesmas questões básicas de sobrevivência, de afeto, de subsistência. “A reflexão é que vai se atualizando como o tempo, quando as diferentes camadas vão entrando em contato umas com as outras. A cada ano tinha um tipo de reverberação”, analisa.
Expectativa
Marcos Breda considera Pelotas uma praça muito aguardada, por considerar o público exigente e inteligente. “É um excelente termômetro da qualidade de um espetáculo, além de ser um público também carinhoso, acolhedor, receptivo e eu tenho um prazer muito grande de estar na cidade onde tenho muitos amigos”.
Origem
O homem e a mancha foi dirigido originalmente por Luis Artur Nunes, já com Marcos Breda, logo após a morte de Caio Fernando Abreu, em 1996. Foi em 2016, para comemorar os 20 anos da primeira montagem, que a releitura apresentou uma proposta multimídia para o trabalho. A peça, dirigida por Aimar Labaki, é apresentada em formato híbrido, além da palavra narrada e dramatizada, com imagens e sobreposição de cenas gravadas, música e iluminação que propõem diálogo entre a memória e o presente. Além do Breda jovem, dos anos 1990, o próprio Caio Fernando Abreu pode ser visto e ouvido, em gravações, levando o público a entender o que ele, como autor, desejava para cada cena.
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