Pesquisa

À procura de gestantes

Trabalho do Programa de Pós-Graduação em Saúde e Comportamento da UCPel investiga causas e consequências da depressão gestacional

Jerônimo Gonzalez -

“Se você engravidar nos próximos seis meses, entre em contato conosco.”

Nos últimos dias esse pedido tem sido feito através de um material entregue em alguns locais de Pelotas e deixado mulheres curiosas. Afinal, a busca também visa futuras mães que estejam com até 24 semanas de gestação e oferece monitoramento com ultrassom, teste do olhinho para o bebê e até fraldas. Trata-se do programa Gravidez Cuidada, Bebê Saudável, projeto de pesquisa da Universidade Católica de Pelotas (UCPel) que está selecionando 1,2 mil mulheres pelotenses para que sejam acompanhadas por psicólogos e psiquiatras durante a gravidez e no período pós-parto. Financiada pela Fundação Bill & Melinda Gates e pelos ministérios da Saúde e da Ciência e Tecnologia, a pesquisa quer atacar um problema grave, mas pouco discutido: a depressão gestacional.

Uma pesquisa desenvolvida pelo Departamento de Saúde Mental da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) com cerca de 250 mulheres aponta que 17% delas passaram por processo depressivo durante a gravidez. Ou seja, praticamente duas em cada cinco enfrentam o problema e, na maioria dos casos, sem qualquer acompanhamento psicológico.

É o que explica o professor da UCPel Ricardo Pinheiro, coordenador do projeto pelotense. “É mais comum ouvir falar de transtornos pós-parto. Mas precisamos estudar a gestação para compreender o que leva as mulheres a desenvolverem a depressão e de que forma podemos evitar e tratar”, explica. Iniciado em junho do ano passado, o programa já conta com cerca de 500 voluntárias cadastradas e sob acompanhamento.

Uma delas é a estudante Tcheslen Kathelen. Aos 21 anos, mãe de primeira viagem, descobriu o programa através de uma visita da equipe de pesquisa a sua rua, no Navegantes. Com risco de desenvolver depressão devido ao histórico (já tinha passado por isso aos 13 anos), passou a fazer o acompanhamento semanal com psicólogos a partir dos quatro meses de gestação. “O bebê foi planejado, mas houve momentos em que bateu uma insegurança grande. Muito medo de não ter condições de dar conta de tudo e isso me deixava para baixo. Foi aí que o acompanhamento fez diferença e deixou para trás essa culpa que eu sentia”, conta.

Segundo Pinheiro, a pesquisa que está sendo feita com as gestantes de Pelotas tem hoje como objetivo principal prevenir e tratar os sintomas de depressão nas mulheres. Num segundo momento, através do acompanhamento das mães e dos recém-nascidos, entender claramente quais os impactos para as crianças.

Um estudo publicado no Caderno de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) em 2012 pela coordenadora da pós-graduação em Gestão Hospitalar e dos Serviços de Saúde, doutora Letícia Menezes, aponta que mães que passaram por isso na gestação possuem quatro vezes mais chances de terem filhos com baixo peso ao nascer. O que pode prejudicar o desenvolvimento socioemocional e até a coordenação motora.

Felizmente, não é o caso da pequena Ana Vitória. Em pleno desenvolvimento aos três meses e meio de idade, ela é a razão dos sorrisos de Tcheslen. Ela recomenda: se tiverem a oportunidade, todas as futuras mães devem ser voluntárias. “Principalmente as bem jovens, que por inexperiência ou até falta de apoio familiar podem sofrer muito e isso influenciar na relação com o bebê”, aconselha.

Resultados começam a aparecer
Embora ressalte que ainda é cedo para se tirar conclusões, o coordenador da pesquisa se mostra otimista com as primeiras impressões. Dentre as futuras mães diagnosticadas com transtornos depressivos e que aderiram ao método de tratamento proposto, 78% tiveram os sintomas eliminados ou reduzidos. Bem acima do índice observado em terapias convencionais, mais longas e menos abrangentes, de 50% de remissão.

Já entre as grávidas apontadas com risco de transtornos e que iniciaram acompanhamento pela equipe, o resultado é ainda melhor: apenas 2% se tornaram depressivas. “Isso mostra o quanto o caráter preventivo é importante, pois as mulheres com possibilidade e que não aderiram ao tratamento apresentaram 15 vezes mais chances de ter depressão”, aponta Pinheiro.

Mais do que animadores, os resultados podem inspirar novos modelos de acompanhamento gestacional tanto no Brasil quanto em outros países. Em outubro do ano passado os primeiros indicadores foram discutidos com representantes da Fundação Bill & Melinda Gates, em Londres. Agora em abril será a vez do Ministério da Saúde conhecer os primeiros dados.

“Esperamos completar até setembro o cadastro das 1,2 mil gestantes para que em outubro, em Washington, em nova reunião com a fundação, possamos ter uma base de informações mais completa e que possa apontar, quem sabe, novos caminhos ao projeto. A ideia é tornar isso um novo modelo de acompanhamento de gravidez das mulheres no Sistema Único de Saúde (SUS) e em outros países”, projeta o pesquisador.

O que é preciso para ser voluntária
- Estar no primeiro ou segundo trimestre de gravidez (até 24 semanas)

- Ter entre 15 e 49 anos

- Morar em uma das 254 áreas de Pelotas selecionadas pela pesquisa

- Mais informações pelos telefones (53) 2128-8246 e (53) 99123-7350

Cinco fatores para depressão gestacional
 Apesar de serem inúmeras as razões que podem desencadear o transtorno, algumas são bastante comuns:

- Histórico depressivo na família

- Gravidez não planejada

- Falta de apoio familiar

- Violência doméstica

- Solidão

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