Meio ambiente

Abelhas: problema de quem?

Tradicionalmente executada pelo Corpo de Bombeiros, a tarefa de retirar abelhas dentro da cidade já não é mais realizada pela corporação

Infocenter -

O problema começa de repente. De um dia para o outro, especialmente nos meses mais quentes, colônias de abelhas passam a se instalar com maior frequência em áreas urbanas. Uma árvore no pátio, uma janela ou até mesmo um poste na rua são os pontos mais comuns. E a primeira reação de quem encara um enxame como esse é ficar em alerta e buscar alguém para fazer a retirada com segurança. E é aí que tudo fica mais complicado.

Tradicionalmente executada pelo Corpo de Bombeiros, a tarefa de retirar abelhas dentro da cidade já não é mais realizada pela corporação. E sem esse apoio, a população tem enfrentado dificuldades para remover os insetos.

Segundo o sargento Claudemir Vergara, os bombeiros não realizam mais a retirada porque não contam com equipe especializada. "Hoje não temos pessoal para isso. São animais que exigem conhecimento técnico e o ideal é que se busque o contato com apicultores ou até mesmo a Secretaria de Qualidade Ambiental (SQA)", justifica.

No entanto, se alguém buscar as opções apontadas pelo sargento, dificilmente conseguirá resolver o problema. Conforme o secretário Felipe Perez, a SQA também não possui funcionários habilitados para esse tipo de trabalho. "Sempre foi uma tarefa dos bombeiros. Não tínhamos conhecimento de que eles deixaram de fazer o atendimento nestes casos. Eu mesmo tive um enxame no meu pátio há alguns meses e foi retirado por um bombeiro", afirma.


A saída, então, são os apicultores?

Indicados tanto pelos bombeiros quanto pela SQA como alternativa para remoção de enxames, nem mesmo os apicultores estão querendo prestar este tipo de serviço. E a razão é grave e tem alto impacto ambiental. Alguns apontam que as abelhas levadas para áreas rurais e instaladas em caixas para formarem colônias têm "fugido" do campo por conta do uso excessivo de agrotóxicos. Os produtos, pulverizados nas lavouras, acabam se espalhando pelo ar e contaminando flores e plantas em outras propriedades, espantando os insetos.

Para o engenheiro agrônomo da Embrapa Clima Temperado Luís Fernando Wolff, o fenômeno é cada vez mais comum e tende a se agravar se não houver uma mudança no manejo das plantações. "A eliminação da vegetação nativa pela agricultura intensiva e, sobretudo, o excesso de agrotóxicos, afetam diretamente a capacidade de sobrevivência das abelhas", alerta o pesquisador especialista em Entomologia e Toxicologia de Agrotóxicos.

Com grande produção de frutas, a região colonial é um ambiente naturalmente favorável às abelhas. Os insetos são, inclusive, muito importantes para o desenvolvimento das plantas por fazerem a polinização. Contudo, alerta Wolff, por serem culturas que têm florada apenas uma vez ao ano, isso acaba prejudicando as colônias de abelhas. "Para piorar, o controle de pragas nas lavouras é feito com inseticidas à base de nicotina, os neonicotinoides, já proibidos em diversos países e ainda usados no Brasil".

Cidades viram abrigos

Tamanha é a dificuldade de adaptação das abelhas a este cenário de contaminação no campo que as regiões urbanizadas acabam se tornando mais atrativas. Praças, jardins e pátios de casas oferecem alimento sem contaminação e abrigo às colmeias.

Acostumado a identificar as diferentes espécies de insetos e orientar a remoção, o coordenador do Departamento de Meio Ambiente da Cruz Vermelha Fabrício da Silva explica que matar é a pior das alternativas. Segundo ele, muitas espécies estão sob risco de extinção e eliminá-las pode ser crime ambiental.

"Além disso, corremos o risco de vivermos um cenário como o de Gramado ou Canela. Lá as abelhas praticamente sumiram e prejudicam a própria atividade rural, o que obriga os produtores a alugarem colônias de abelhas de outros locais", conta o biólogo.

Na região de Pelotas, acompanhamentos feitos pela Embrapa apontam para uma mortandade de até 40% dos enxames em algumas localidades. A solução? Iniciar uma redução no uso de herbicidas, fungicidas, acaricidas e inseticidas até chegar a um ponto ideal em que se deixe de usar os agrotóxicos.

"É perfeitamente possível fazer o manejo com base ecológica e sustentável. Para isso é preciso que institutos de pesquisa e entidades públicas apliquem projetos que capacitem o homem a produzir no campo com defensivos naturais, sem químicos", sugere Luís Fernando Wolff.

Se isso não for feito, o Ibama alerta que pelo menos 60% das 141 espécies de plantas cultivadas no país para alimentação, produção animal, biodiesel e fibras podem ser afetadas, impactando diretamente na sobrevivência das abelhas e outros insetos polinizadores.

Em fevereiro, o instituto publicou a Instrução Normativa (IN 02/2017) que condiciona o registro de agrotóxicos. Para serem liberados, os produtos precisarão trazer informações claras sobre o uso adequado que evite efeitos sobre o desenvolvimento e a reprodução das abelhas. Uma tentativa para manter vivo o "emprego" destes insetos e garantir que as plantas continuem nascendo e até o alimento chegue às nossas mesas.

É uma saída. "Ou, quem sabe, teremos que em breve contratar pessoas para fazer o trabalho das abelhas na natureza", brinca Silva.


Brigada Apícola

A Embrapa Clima Temperado deu início ao processo de formação de uma Brigada Apícola. O objetivo é estabelecer ainda este ano um grupo de apicultores que serão cadastrados e treinados para atuar na remoção de enxames em áreas urbanas da região de Pelotas.

O grupo será formado com a participação da Emater, de cooperativas e associações de apicultores, da prefeitura e do Corpo de Bombeiros. Após a formação desta Brigada, os casos de invasão de abelhas atendidos pelo telefone 193 dos bombeiros ou através de outros órgãos públicos serão direcionados para esta equipe.

Contato
Em caso de enxames de abelhas a comunidade pode entrar em contato com o biólogo Fabrício da Silva, através da página facebook.com/animaispeconhentospelotas

Carregando matéria

Conteúdo exclusivo!

Somente assinantes podem visualizar este conteúdo

clique aqui para verificar os planos disponíveis

Já sou assinante

clique aqui para efetuar o login

Por que matar? Anterior

Por que matar?

Metalúrgicos lotam Cidec-Sul para audiência pública sobre Polo Naval Próximo

Metalúrgicos lotam Cidec-Sul para audiência pública sobre Polo Naval

Deixe seu comentário