Educação
Ações buscam garantir o direito ao Piso do Magistério
Em torno de 40 professores já estão recebendo o valor estabelecido em lei, como vencimento inicial da carreira
Gabriel Huth -
O número de professores municipais que recorrem à Justiça para fazer valer o Piso Nacional do Magistério não para de crescer. A estimativa é de que só pelo Sindicato dos Municipários de Pelotas (Simp), mais de 400 ações foram ajuizadas e, pelo menos, 40 profissionais já conquistaram o direito de receber o piso como vencimento inicial da carreira, como prevê a lei. Outros cerca de 40 servidores também obtiveram sentença favorável, mas ainda não sentiram o reflexo no bolso em função de recursos apresentados pela Procuradoria-Geral do Município ao Tribunal de Justiça, em Porto Alegre, para tentar reverter a decisão.
Os resultados são motivo de comemoração, mas não alteram em nada a decisão da categoria: enquanto a prefeitura não cumprir a Lei do Piso, os professores não sentam para conversar sobre o novo Plano de Carreira, em fase de elaboração pelo governo. “Sem piso não se mexe em carreira”, resume a presidente do Simp, Tatiane Rodrigues. Ainda que o Plano em vigor tenha quase 30 anos. É de 1989.
O secretário de Educação e Desporto, Artur Corrêa, prefere não comentar nenhum dos temas. Repassa as discussões do piso à Procuradoria do Município e, quando a pauta se volta ao Plano de Carreira, afirma: “A proposta está em formatação. Estamos debatendo, mas a coordenação está a cargo do gabinete da prefeita”.
Na última sexta-feira Paula Mascarenhas (PSDB), inclusive, reuniu-se com vereadores da base do governo na Câmara e, ao falar na importância de corrigir o que chamou de situações inadequadas na composição salarial dos professores, destacou a necessidade de aprovação do Plano de Carreira. “Antes haverá debate com a categoria. Não poderia ser diferente”, garante o secretário de Educação. A dúvida é quando as duas pontas, Executivo e servidores, conseguirão abrir o diálogo e chegar a consenso.
Decisão coletiva segue na Justiça
Até hoje os professores municipais de Pelotas aguardam para sentir os efeitos práticos da ação civil pública ajuizada pela Promotoria para que os trabalhadores tenham o direito de receber o Piso do Magistério respeitado. A decisão da 4ª Vara Cível Especializada em Fazenda Pública de Pelotas, em julho de 2015, considerou procedente a ação do MP.
Um recurso encaminhado pela prefeitura ao Tribunal de Justiça (TJ), entretanto, permanece sem decisão. Desde fevereiro de 2016, a papelada está parada na 4ª Câmara Cível, na capital. A expectativa é de que o processo entre em breve na pauta - informa a assessoria de imprensa do TJ. Mas, em resposta por e-mail, esclarece: a Câmara ainda julga casos de 2015 e segue ordem cronológica.
O próprio MP fica em compasso de espera, sem alternativa para fazer valer o interesse coletivo. “A ideia com a ação ajuizada em 2013 pelo promotor Olavo (José Olavo dos Passos) era exatamente que uma decisão pudesse beneficiar vários professores. Mas, neste momento, não não temos o que fazer. É preciso aguardar”, enfatiza o atual promotor regional de Educação, Paulo Charqueiro.
Outro impacto
A demora do TJ em apreciar o recurso apresentado pela prefeitura para tentar anular a ação do Ministério Público, traz reflexos a processos individuais. Tanto um dos juízes de 1ª instância quanto desembargadores, em Porto Alegre, têm segurado as decisões, para tomar o entendimento do TJ a esse recurso, em especial, como balizador das interpretações que estão por vir - explica o advogado do Simp, Samuel Chapper.
A posição do STF
Em 27 de abril de 2011, o Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu a constitucionalidade da lei 11.738/2008, que regula o piso salarial nacional dos profissionais do magistério público da Educação Básica. Com a publicação da decisão no Diário Oficial da União, em 24 de agosto de 2011, não restava mais nenhuma dúvida: todos os estados brasileiros deveriam estabelecer, imediatamente, o piso como vencimento inicial das carreiras dos professores.
Aplicar completivos para atingir o valor fixado como teto e não como ponto de partida, para o cálculo de vantagens conquistadas ao longo da trajetória profissional, é ilegal. É o entendimento do STF.
A voz da categoria
Valorização forçada
A diferença é visível. Está no contracheque. Com a vitória na Justiça, o padrão da carreira saltou de R$ 454,03 para mais de R$ 1,1 mil, considerado o contrato de 20 horas semanais. E o professor de História, hoje no quadro do Colégio Pelotense, não demorou para ingressar com a ação. Em 2012, meses depois da decisão do STF, Maicon Bravo decidiu ir em busca dos direitos. Uma espera que se arrastou por mais de quatro anos.
“É constrangedor. O que estamos vendo é a desvalorização do profissional e o sucateamento do serviço público”, resumiu o doutorando em Educação Ambiental, ao servir de porta-voz de servidores de outras áreas, que dependem de complemento para atingir o salário mínimo nacional, exigido por lei. A expectativa daqui para frente fica por conta do cálculo do retroativo, a que também tem direito.
Ânimo, apesar de tudo
A professora de Produção Textual prefere não ser identificada. A bolsa guarda dez pastas, dos trabalhos e criações dos alunos das turmas de 2017. Já são 22 anos de carreira; dez cumpridos na rede municipal de Pelotas. O convívio com os alunos e o compromisso de fazê-los abrir o pensamento, em debates em sala de aula, acabam por se transformar em incentivo para manter o sorriso no rosto, ainda que o contracheque ganhe o nome bem-humorado de “contrachoque”.
O padrão da carreira é tão achatado que o desconto previdenciário - de R$ 359,60 - engole quase 80% dos R$ 454,03. Até agora, a professora não decidiu se também irá recorrer à Justiça em busca do Piso, mas admite: vê com tristeza a situação de colegas que precisam recorrer a medicações para driblar os efeitos da depressão. “É triste isso, mas não sobra dinheiro para lazer e o pessoal não tem uma válvula de escape.”
Sem retorno
O Diário Popular tentou, por três dias, falar com o procurador-geral do Município, Nadison Hax, sobre os argumentos para o não pagamento do Piso do Magistério, nos moldes do que estabelece o STF, mas ficou sem retorno. O DP também não recebeu as informações do número total de professores que já recebem o piso - por força das ações judiciais -, como solicitado ao secretário de Gestão Administrativa e Financeira, Otoni Xavier, e à servidora recomendada por ele.
Conheça alguns números (*)
►Total de professores na rede municipal: cerca de 3,5 mil profissionais
►Valor do salário-padrão para os contratos de 20 horas semanais: R$ 454,03
►O valor da base de cálculo sobre a qual incidem vantagens, como o Difícil Acesso é de R$ 691,02
►O Piso do Magistério estabelecido pelo Ministério da Educação (MEC):
R$ 1.149,40 (para 20 horas semanais)
e R$ 2.298,80 (para 40 horas semanais)
(*) Pela lei, todas as vantagens conquistadas ao longo da carreira devem ser calculadas sobre o valor do Piso Nacional; o que elevaria - e muito - a remuneração dos professores municipais de Pelotas.
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