Drama
Mãe que perdeu bebê denuncia PSP e HU por negligência
Com oito semanas de gestação, sem sangramento e positivada para Covid-19, equipe médica orientou isolamento até fazer a curetagem
O drama de uma mãe que perdeu o bebê na oitava semana de gestação virou boletim de ocorrência e denúncia ao Ministério Público (MP) em Pelotas. A situação foi diagnosticada na segunda-feira (19), mas a internação para fazer a curetagem, em função do aborto retido, foi marcada para o dia 28, já que a paciente havia testado positivo para a Covid-19. A espera e a angústia pela perda do bebê deixam Franciele Rodrigues Crizel, de 26 anos, inconformada. A família teme uma possível infecção e a possibilidade de ela não poder dar um irmão ou irmã à filha de cinco anos, no futuro. Além da dor física, a paciente sente o abalo emocional causado por idas e vindas ao Pronto-Socorro de Pelotas (PSP) e ao Hospital Universitário São Francisco de Paula (HU-UCPel).
Pelo relato da mãe de Franciele, Elisângela do Amaral Rodrigues, que é pescadora na Colônia Z-3, o atendimento foi negligenciado. "Como vão deixar minha filha com feto morto por tanto tempo, podendo apodrecer lá dentro", desabafou. A saga da Franciele teve início dia 19, quando procurou o PSP com dores no baixo ventre. "Fizeram os exames e mandaram eu ir no outro dia no 'Clínicas' para fazer a curetagem. Retornei no dia marcado, mas a alegação foi que não poderia ser internada pelo fato de ser feriado", conta. "Recebi a orientação de voltar ao PS no dia seguinte e, novamente, me passaram para o hospital, onde fizeram exame e positivei para Covid-19. Foi quando descobri que só poderia fazer o procedimento dia 28, após o período de isolamento."
Na quarta, as dores se intensificaram e a paciente buscou novamente atendimento de urgência, onde passou a noite sendo medicada. Na manhã desta quinta-feira (22), no entanto, ela teve alta. "Me disseram que só se eu tivesse muito sangramento, pois no exame de toque deu que a placenta estava intacta", relatou a jovem, que após ter tido a filha em 2017, já apresentou quadros hemorrágicos. Foi quando a família decidiu registrar o fato na polícia.
Na Delegacia de Polícia de Pronto Atendimento (DPPA), mais uma decepção. Na busca por justiça, ela ouviu que nem deveria estar ali por causa da Covid-19. Embora fragilizada, deixou o local com o Boletim de Ocorrência e decidiu ir para casa fazer o isolamento. A denúncia ao Ministério Público foi feita por Elisângela que, agora, aguarda por resultados concretos e ações que possam preservar a saúde da filha.
Contraponto
A direção do Pronto-Socorro de Pelotas (PSP) confirma todos os atendimentos, com algumas ponderações em relação ao relato da paciente que, no dia 19, deu entrada na emergência pela dor no baixo ventre. A gestante passou por ultrassom transvaginal onde foi identificado um aborto retido (gravidez retida dentro do útero após morte embrionária ou fetal) e que, pelo tempo de gestação de oito semanas, não se trata de um feto morto, segundo explicação dos médicos que a atenderam.
Ainda conforme a direção do PSP, na consulta de retorno, uma nova avaliação identificou que o colo do útero estava fechado e não havia sangramento. Nesse momento foram oferecidas duas possibilidades de conduta à mãe: a de expectante, que pode levar até 30 dias, quando o próprio corpo expulsa o material retido, ou internar para realizar a curetagem uterina. Pela nota, a própria gestante decidiu pela conduta expectante e foi orientada a retornar caso mudasse de opinião.
De acordo com o prontuário, na quarta-feira, a paciente voltou ao PSP e passou por nova avaliação, que detectou que o colo do útero permanecia fechado. Por solicitação da paciente, o médico fez o encaminhamento para que ela fosse internada na Maternidade do HU para realizar a curetagem. No entanto, como o resultado do teste de Covid-19, procedimento padrão, foi positivo, a equipe médica orientou Franciele a cumprir o isolamento em casa e retornar em sete dias, ou caso apresentasse sangramento passasse por nova avaliação. Nesta quinta, após um possível sangramento, a jovem foi atendida e passou por exame físico e ginecológico que não confirmou o relato. "Como o colo do útero segue fechado, a paciente tem condições de aguardar a conduta expectante ou até que o período de isolamento do coronavírus seja concluído para internar e realizar a curetagem", informou a direção do PSP.
Já o HU preferiu se manifestar sobre o assunto em nota oficial e de forma sucinta. Nela, a administração esclarece que a paciente foi encaminhada ao atendimento da Maternidade, onde foi acolhida, avaliada, e conforme quadro clínico e conduta médica, agendado o procedimento. Foi orientada, ainda, a retornar imediatamente ao atendimento, diante de qualquer intercorrência.
A reportagem ouviu especialistas que preferem não se identificar, pela situação. Eles confirmam que este é o procedimento padrão, desde que a paciente não apresente sangramento pelo deslocamento da placenta. E, por isso, a única complicação é emocional. O caso agora está com a Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher (Deam) e com o Ministério Público. "Não sei explicar o que estou sentido, se é raiva, tristeza. Sei que estou sem chão, sem rumo de saber que meu filho está dentro de mim, sem vida. Estou tentando ser forte por minha filha".
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