Saúde
Pontualmente, na hora errada
Doença sexualmente transmissível e uso de drogas favorecem casos de partos prematuros
Jerônimo Gonzalez -
A lista de fatores que podem desencadear um parto prematuro, ou seja, aquele que ocorre antes de se completarem 38 semanas de gestação, é longa e requer atenção.
Na maioria dos casos, o estresse, a obesidade, a diabetes, a pressão alta e outros problemas de origem fisiológica acabam contribuindo para acelerar o nascimento dos bebês. Porém, nos últimos anos e, principalmente de 2015 para cá, duas epidemias passaram a figurar de forma representativa entre estes agravantes: a das drogas e a da sífilis.
Em Pelotas, até o primeiro semestre deste ano foram registrados 200 casos novos da doença sexualmente transmissível, e entre eles, 44 casos em grávidas e 38 congênitas, total que deve aumentar quando os filhos nascerem. Situação que se repete quando se trata do consumo de drogas, especialmente o cigarro e o crack. E o problema não para por aí. Quanto mais prematuros, maior o índice de mortalidade infantil, por se tratarem de crianças de risco. Maior também a possibilidade de malformações e deficiências, em decorrência das DSTs e da dependência química. Um quadro de saúde pública e social alarmante e que, em função da sua importância - e preocupação das autoridades -, teve um mês inteiro (novembro) dedicado a discussões e conscientizações entre mães, pais e comunidade médica.
O problema é nacional e leva o Brasil a ocupar a 10ª posição no ranking mundial de prematuridade, com cerca de 300 mil bebês prematuros por ano. Na UTI Neonatal do Hospital-Escola da UFPel/Ebserh a alta rotatividade nos nove leitos disponíveis comprova os reflexos da realidade vivida no restante do país. “Já avançamos bastante, mas ainda há um caminho enorme pela frente”, aponta a pediatra Maria Amália Saavedra. Apesar disso, ainda é necessário enfrentar nesta caminhada alguns retrocessos como, por exemplo, o retorno da sífilis.
A doença, quando não provoca o aborto espontâneo, pode levar ao parto prematuro, além das complicações à saúde da mãe e do bebê. “Todo dia vemos um caso novo passando pelo hospital de uma gestante portadora da DST. É incrível, mas as pessoas estão parando de usar camisinha e abrindo portas para o retorno de doenças que há muito não precisávamos lidar.” A resistência ao tratamento também é um entrave. A pediatra ressalta que para diagnosticar a doença basta um teste, sem que seja necessário marcar uma consulta médica, ou seja, é mais fácil o acesso. Para tratar, é preciso que ambos os parceiros recebam a medicação e administrem corretamente até o final. Porém, é comum que este seja interrompido e mesmo realizado unilateralmente, o que contribui para o crescimento dos casos.
Preocupação
Muitos partos prematuros também estão ligados ao crescente consumo de crack e ao fato das gestantes não abrirem mão do cigarro durante o período da gravidez. Neste caso, a vulnerabilidade desta mãe e do bebê torna os riscos da mortalidade infantil bem maiores. São mulheres que chegam, segundo Maria Amália, muitas vezes sem terem realizado qualquer consulta ou buscado acompanhamento médico durante o período gestacional, fator este combinado com o uso indiscriminado de substâncias químicas que afetam diretamente o desenvolvimento do feto. Há muitos casos em que, devido à sua condição, abandonam o bebê após o nascimento ou retornam poucas vezes ao hospital para acompanhá-lo. E dificilmente possuem o parceiro ao lado, carregando sozinhas a responsabilidade pela criança.
A Secretaria de Saúde (SMS) acompanha esta realidade através do Setor de Ações em Saúde. A diretora, Eliedes Ribeiro, explica que o maior desafio no trabalho que se busca desenvolver através de programas como o Estratégia Saúde da Família (ESF), que muitas vezes atua com a equipe da Redução de Danos, é a adesão. Se parte para a comunidade em busca dessa gestante, para conscientizá-la, estimular a realização do pré-natal, mas dificilmente se consegue avançar, pois são mulheres que costumam trocar muito de endereço e não têm laços familiares a que se possa recorrer. “Temos estrutura, equipe, programas, mas o acesso a essa pessoa ainda é muito difícil. E sem o acompanhamento médico os riscos de prematuridade tornam-se muito grandes e os da mortalidade maiores ainda.”
Pré-natal é a palavra de ordem
Autoridades, comunidade médica e órgãos de saúde são unânimes em afirmar que o passo mais importante para se ter uma gestação tranquila e diminuir os riscos de um parto prematuro é a realização do pré-natal.
Durante as consultas que serão identificados possíveis riscos, serão repassadas as orientações e será monitorada a saúde da mãe e do bebê. O mínimo, ressalta Maria Amália, é de que sejam feitas seis visitas ao médico e um ultrassom. Foi assim que Suelen Coelho descobriu um pequeno problema no útero, que tornava a gravidez de risco. Com o acompanhamento devido, na 26ª semana o pequeno Raul veio ao mundo com pouco mais de 500 gramas. “Desde a 23ª semana já vinha com contrações e sabia que poderia acontecer, mas mesmo assim não estamos preparadas para o momento e para as complicações que surgem. Ele cabia nas minhas duas mãos, ainda não consegui pegar no colo”, conta a mãe do pequeno que nasceu há pouco mais de um mês. Desde então muitos foram os desafios, devido aos problemas médicos comuns em partos precoces, todos sendo lentamente vencidos por Raul dia após dia. O pequeno recebe a visita da mãe diariamente, pois acredita-se que o contato estimula o desenvolvimento dos bebês prematuros, além de fortalecer laços. A expectativa agora é pelo crescimento e a saúde de Raul para que seja possível a tão sonhada alta.
Outros fatores que levam à prematuridade
Baixo peso
Distúrbios de coagulação
Infecções do trato urinário
Sangramento vaginal
Gestações muito próximas (período menor do que nove meses entre o nascimento do bebê e uma nova gravidez)
Gravidez fruto de fertilização in vitro
Idade menor de 17 anos e acima de 35
O prevenir
Converse sempre com o ginecologista/obstetra
Revele ao médico o seu histórico de saúde e o do pai do bebê
Não fume
Não se automedique
Esteja alerta para sangramentos, líquidos e secreções vaginais
Evite bebidas alcoólicas
A sífilis
É uma Infecção Sexualmente Transmissível (IST) causada pela bactéria Treponema pallidum. Já a congênita é transmitida da mãe para a criança na gestação. São complicações desta forma da doença: aborto espontâneo, parto prematuro, má-formação do feto, surdez, cegueira, deficiência mental e/ou morte ao nascer. Por isso, é importante fazer o teste para detectar a sífilis durante o pré-natal e, quando o resultado for positivo, tratar corretamente a mulher e o seu parceiro sexual, para evitar a transmissão vertical.
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