Ruim
Poucas horas de frio podem ter reflexos no pêssego
Maior produtora da fruta em conserva no país, região de Pelotas tem inverno menos rigoroso, o que traz riscos ao desenvolvimento dos pomares
Jô Folha -
Se para quem vive na cidade as temperaturas amenas agradam e o que assusta é o frio próximo a zero como o registrado dias atrás, para 1.214 famílias de Pelotas e municípios vizinhos a preocupação é oposta.
Responsáveis pelos pomares de pêssego que geram milhares de empregos e movimentam a economia, estes produtores dependem das baixas temperaturas para que as plantas se desenvolvam e garantam uma boa safra no final do ano. E é aí que está o problema. Enquanto o ideal desde o começo do inverno seria de pelo menos 250 horas de frio até o momento, o acompanhamento feito pela Estação Experimental Cascata (EEC) da Embrapa Clima Temperado registra pouco mais da metade disso: 135 horas.
Mas e por que o frio é tão importante? Quem explica é o engenheiro agrônomo da Emater Evair Ehlert. “A temperatura abaixo ou igual a 7,2ºC é fundamental para o desenvolvimento do pêssego, pois a planta precisa desse período de dormência sob clima gelado. Depois disso, sim, há a necessidade das temperaturas mais elevadas para gerar os frutos.” Ou seja, o inverno com mais cara de primavera e verão pode ser bom para passear, mas ruim para quem produz.
Que o diga o fruticultor Dari Bosembecker. Com 30 hectares plantados na Colônia Santa Helena, 8º Distrito de Pelotas, ele conta que sua maior preocupação não está nas poucas horas de frio sob seus pessegueiros, e sim sobre o calor excessivo que os termômetros têm registrado para esta época do ano. “O que é muito ruim é termos dias com temperatura acima dos 25ºC e bem na época da floração, o que acaba queimando a flor que irá se transformar em fruta”, diz, após pulverizar as plantas para evitar que também os fungos virem dor de cabeça. Aos 55 anos e com a experiência de quem é “nascido em um pessegueiro”, como costuma brincar, o persicultor mostra que o resultado do veranico é que alguns galhos brotaram duas semanas antes do tempo ideal, o que pode se refletir em plantas com menos vigor e, consequentemente, impacto na qualidade da produção.
Produção, aliás, que não é pouca. A cada ano são colhidos em média 50 milhões de quilos da fruta que vão em sua quase totalidade para as indústrias. Ano passado o resultado foi ainda melhor, com 66 milhões de quilos. Números que fazem de Pelotas, Canguçu, Morro Redondo, Piratini, Cerrito, Arroio do Padre, São Lourenço do Sul e Jaguarão a região que mais fornece pêssego em conserva no país, concentrando 90% de todas as latas que chegam ao mercado.
No entanto, diante dos poucos dias de inverno para valer, fruticultores e especialistas estão atentos à produção deste ano. “Por enquanto ainda não há motivos para acreditar em quebra de safra, mas a luz amarela de alerta está ligada”, pondera o extensionista da Emater em Pelotas, Márcio Carlos Guedes. Como a maioria dos produtores mescla entre pelo menos quatro variedades de pêssego, cada uma com exigência de frio e intervalo de floração e colheita distintas, a expectativa é por uma safra 2017/2018, entre novembro e janeiro, sem sobressaltos. “O grande risco seria frio com geada tardia em setembro. Isso causaria perdas das frutas em desenvolvimento”, analisa Guedes.
Indústria também de olho no clima
Para os produtores, a ansiedade por dias mais frios. Já para as fábricas, a melhor definição para o momento é cautela. Mesmo preocupado com o calor que deve aumentar e chegar próximo aos 30ºC no final de semana, o Sindicato das Indústrias de Doces e Conservas Alimentícias de Pelotas (Sindocopel) prefere aguardar alguns dias antes de projetar sucesso ou dificuldades para a cadeia produtiva.
De acordo com o presidente da entidade que reúne as conserveiras da cidade, Paulo Crochemore, se confirmar a previsão de altas temperaturas o impacto tende a ser inevitável para quem planta e para quem enlata. “Uma das variedades de pêssego, o granada, representa 25% do que chega às indústrias. E é esse cultivar que pode ser mais afetado se houver calor nos próximos dias, com as plantas sendo queimadas”, comenta.
A hipótese de uma safra frustrada é sempre preocupante diante do que representa para a economia da região. Afinal, são mais de 50 milhões de latas da fruta em calda que vão para as gôndolas dos mercados do país inteiro e ajudam a movimentar cerca de R$ 600 milhões por ano dos pomares às fábricas. Se o calor é bom para aproveitar o dia de mangas curtas, é o frio do inverno da Zona Sul que faz trabalhadores rurais e industriais arremangarem as camisas e gerarem riqueza.
As fases do pêssego
Dormência - Durante o período de frio (temperaturas inferiores a 7,2ºC) as gemas que darão origem a galhos, folhas e flores se formam. Depois disso entram em dormência completa e voltam a se desenvolver. A necessidade de baixas temperaturas varia conforme a espécie de pêssego, indo desde 100 horas até mais de 400 horas.
Fase vegetativa - Inicia após o inverno e, com as temperaturas mais altas durante o dia e baixas à noite, é quando nascem novos galhos, folhas e flores no pessegueiro. Em seguida surgem os frutos.
Os números
1.214 famílias produtoras na região (85% do total do RS)
Pelotas (605), Canguçu (480), Morro Redondo (100), Piratini (12), Cerrito (10), Arroio do Padre (3), São Lourenço do Sul (3) e Jaguarão (1)
66 milhões de quilos na safra 2016/2017
Foram 63,9 milhões de quilos para indústria e 2,1 milhões de quilos de pêssego de mesa
13 indústrias na região
Pelotas (7), Morro Redondo (5) e Capão do Leão (1)
7 mil empregos diretos durante o período de safra
São Paulo é o principal comprador. Os paulistas consomem 30% das latas de conserva da região
6.450 hectares de pomares
Responsável por 90% da produção de pêssego em conserva no Brasil e 95,3% do RS
R$ 600 milhões movimentados por ano. A produção rende em média R$ 64 milhões diretamente às famílias produtoras da Zona Sul
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