Chuva

Z-3 de olho no nível da Lagoa

Excesso de chuvas coloca a comunidade em alerta, já que águas que escoam do Norte do Estado aumentam o nível da Lagoa dos Patos

Paulo Rossi -

Quando acordou na manhã desta quinta-feira (8) na Colônia de Pescadores Z-3, o pescador aposentado Élio Sabino seguiu a rotina que mantém desde os tempos em que ainda saía de barco com o pai: abriu a porta de casa, sentiu a direção do vento e conferiu o barômetro centenário, herança paterna, pendurado na parede da sala. Espanto. O nível da Lagoa dos Patos, que está alto, mesmo com a combinação entre a temperatura amena para a época do ano, o vento calmo e a baixa pressão atmosférica registrada, não eram bom sinal.

Com a experiência de uma vida inteira à beira ou dentro d’água, Élio, 64 anos, sabe quando há perigo no ar. Não tem dúvidas de que o excesso de chuvas que cai em municípios da Região Metropolitana e da Serra gaúcha nas últimas semanas pode representar risco para as famílias da Z-3, na Zona Sul do Estado. Especialmente se houver uma virada no vento, que por enquanto ainda sopra de Sudoeste e afasta o perigo da quantidade de água que entra na Lagoa a partir da confluência dos rios do Norte do Estado.

“O que assusta é esse nível alto mesmo sem muita chuva e com vento calmo. Mas todos já estamos atentos, pois se virar um vento de Nordeste, toda essa água lá de cima desce rápido e invade a colônia”, explica, lembrando o ocorrido em 2015, quando famílias da Z-3, Laranjal e Pontal da Barra precisaram deixar suas casas por até 20 dias até que a lagoa recuasse.

Apesar da calmaria a que Élio se refere, alguns pontos da Z-3 já preocupam. Na Divineia a água alcançava a altura da margem, obrigando pescadores a recolher instrumentos que costumam deixar à beira d’água. No Cedrinho, a dona de casa Jéssica Bica precisou ser socorrida às pressas pelo sogro. Grávida de três meses e com duas filhas pequenas, de oito e 12 anos, viu a água e a lama subirem rapidamente pela manhã e entrarem pela porta de casa. “Estou juntando as coisas dela e levando para uma casa alugada na parte mais seca, não dá para ficar aqui com as crianças esperando”, justificou Luís Carlos Sousa, o sogro de Jéssica. Ele reclama que o alagamento tão rápido no local se deve à falta de limpeza no Arroio Sujo. “Já cansamos de pedir, mas a prefeitura nunca aparece.”

Precaução e monitoramento
Segundo o professor de Ecologia da Universidade Federal do Rio Grande (Furg), Marcelo Dutra, áreas como a Z-3 e o Laranjal são diretamente atingidas pelo grande volume de águas que drenam em direção à Lagoa dos Patos.

“O evento se agrava com as chuvas locais e o vento contribui represando e consegue escoar em direção ao oceano no estuário de Rio Grande. As áreas baixas e mais expostas de Pelotas ficam sujeitas ao alagamento”, esclarece.

Há 52 anos na colônia de pescadores, o casal Adir e Derli Vieira, ambos com 72 anos de idade, não deixa de se preocupar com a possibilidade de um vento Nordeste empurrar as águas sobre a comunidade. Porém, o tempo fez com que aprendessem a conviver com a dificuldade e a se precaver. Nos últimos 16 anos foram atingidos por três enchentes.

Enquanto observa dos fundos do pátio se o cais da Divineia está alto ou baixo, acumula no galpão oito cavaletes com meio metro de altura cada. “Da última vez que a Lagoa subiu, a água entrou na cozinha, na sala, nos banheiros. Perdemos armários e outros móveis precisaram de conserto. Dessa vez já me preparei e vou levantar tudo o que puder para não molhar”, aponta.

Por conta desse temor de uma mudança nos ventos, a Defesa Civil acompanha de hora em hora os pontos com maior risco de alagamentos e enchentes, como Z-3, Pontal da Barra e Porto.

Conforme o coordenador, tenente Paulo Darci dos Santos, até a tarde desta quinta-feira o nível da Lagoa dos Patos estava 1,14 metro acima do normal. Bom sinal. Na véspera chegou a alcançar 1,26 metro. Já o canal São Gonçalo continua subindo. Nos últimos dois dias foram mais 12 centímetros, chegando a 1,52 metro acima do habitual.

“Conversamos com os moradores das regiões mais perigosas e ninguém quer sair de casa por enquanto. Continuaremos monitorando e estamos atentos a qualquer necessidade de prestar socorro”, disse.

Embora afirme não haver prognóstico imediato apontando para uma enchente, o coordenador da Defesa Civil, assim como os pescadores, vê semelhanças com 2015. “Não há grande precipitação, mas com o Guaíba e outros rios cheios, tudo isso tem que passar por aqui para desaguar no oceano. Vai depender do vento.”

Previsão
Se o maior risco para os moradores da Colônia Z-3 é o de um vento forte de sentido Nordeste, nos próximos três dias isso não deve ocorrer.

De acordo com os dados do Climatempo, pelo menos até segunda-feira não estão previstas ventanias e o vento deve seguir soprando dos sentidos Oeste e Sudoeste.

Nesta sexta, a frente fria que provocou temporais, sobretudo no Norte do Estado, começa a se afastar e a chuva deve dar lugar às baixas temperaturas. Porém, se na Zona Sul não há risco de ventos fortes, o Litoral Norte deve ser atingido pelos efeitos de um ciclone extratropical que está sobre o oceano, causando rajadas que podem chegar a até 80 km/h.

De olho nos ventos
SUL
Impede o rápido escoamento e represa a água na Lagoa dos Patos, reduzindo a vazão em direção ao oceano através do estuário do Rio Grande.

NORDESTE
O mais perigoso para os moradores da Z-3, do Laranjal e do Pontal da Barra. Acelera o escoamento da água acumulada no Guaíba e na Lagoa dos Patos, jogando em direção a estas comunidades e aumentando o risco de enchentes e inundações.

OESTE/SUDOESTE
Empurram a água da Lagoa em direção contrária a Pelotas, atingindo municípios situados no lado leste da Lagoa dos Patos, como São José do Norte, Tavares e Mostardas.

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