Ademir Medina
Atenção Primária à Saúde: a "menina dos olhos" do SUS
Por Ademir Medina
CEO do Centro de Estudos e Pesquisas Dr. João Amorim (Cejam)
Em um País como o Brasil, em que o sistema público de saúde contempla mais de 190 milhões de cidadãos e cerca de 80% dependem de seus serviços, é importante entender o papel do Sistema Único de Saúde (SUS), que abrange desde um simples atendimento para a avaliação da pressão arterial, por meio da chamada atenção básica ou primária, até um transplante de órgãos, garantindo acesso integral, universal e gratuito.
A Atenção Primária à Saúde (APS) é a porta de entrada dos usuários do SUS e consiste em ações de prevenção, rastreamento, diagnóstico, tratamento e reabilitação de pacientes por meio das Unidades Básicas de Saúde (UBSs), ou do "postinho", como chamado antigamente.
Como gestor de uma Organização Social de Saúde (OSS) que gerencia unidades de saúde, em grande parte públicas, posso afirmar com convicção que a capacidade de atendimento da rede de APS prestou relevantes serviços aos usuários do SUS no período da pandemia e vem fazendo toda diferença pós-pandemia.
O sistema tem potencial para atuar como mecanismo importantíssimo por meio da Estratégia Saúde da Família porque seu atributo de orientação comunitária possibilita reconhecer as necessidades de saúde coletiva em um território, através da análise epidemiológica combinada ao contato direto com a população local. Uma forma de potencializar o SUS é trabalhar de forma regional, agregando os serviços públicos existentes para um bem comum.
A Estratégia Saúde da Família busca promover a qualidade de vida e intervir nos fatores que colocam a saúde em risco, como falta de atividade física, má alimentação e uso de tabaco. Uma das formas de atuação acontece por meio da aproximação com o paciente e do acompanhamento periódico.
No entanto, ainda falta interesse dos médicos em atuarem com medicina da família. De acordo com levantamento do Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems), apenas 2% dos profissionais no País são especialistas na área. Além disso, com a saída de Cuba do Mais Médicos, cerca de 2,8 mil profissionais que atuam na saúde da família devem deixar o programa, gerando déficit enorme na atenção básica do SUS e comprometendo a Estratégia de Saúde da Família.
Está certo, e concordo, que ainda há muitas complexidades na APS, como em outras áreas da saúde, e somente a faculdade não é suficiente para capacitar o profissional a atender essas demandas. Mas, da mesma forma que um médico deve se especializar para fazer cirurgias ou trabalhar em UTI, também precisa adquirir habilidades específicas para atuar na atenção básica, como, por exemplo, saber mapear o território de atuação para entender as demandas locais, usar técnicas de abordagem familiar e trabalhar em conjunto com outros profissionais da equipe (enfermeiro, técnico e agentes comunitários de saúde), além de atuar em parceria com os Núcleos de Apoio à Saúde da Família (Nasf), Centros de Atenção Psicossocial (Caps) e serviços da atenção secundária.
Para mudar esse cenário e incentivar profissionais a ingressarem na área, as palavras-chave são valorização e mudança de cultura, já que a medicina da família é uma especialidade como outra qualquer e deve ser tratada com o mesmo respeito. O incentivo e a mudança de cultura devem começar já na graduação.
Mesmo recente, a Estratégia Saúde da Família pode representar avanço na humanização e valorização do SUS, de seus profissionais e, especialmente, de seus pacientes, com tendências que indicam crescimento e sucesso cada vez maiores.
Para isso, é preciso retomar a centralidade, fortalecer e investir na APS. É nela que a vacinação tem andamento e que os pacientes com sequelas encontram a sua porta de entrada. Com capacitação de profissionais e infraestrutura apropriada, cerca de 90% das demandas podem ser resolvidas na atenção primária, combatendo ainda as desigualdades e viabilizando um SUS cada vez mais humano, democrático e eficiente.
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