Icaro Schultze

Diferenças “multiculturais”: limite entre o respeito e o repúdio

Por Icaro Schultze, Professor e ativista esportivo
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Salut tout le monde! Imagine viver em uma região que engloba 1,3 milhão de pessoas, morar em uma cidade onde residem quase 30 mil pessoas de 206 países, de gêneros, raças, culturas, idiomas e religiões completamente distintos. Eu vivi esta experiência e foi fascinante. Foram 31 dias na Vila Olímpica em 2016, uma área que contava com 31 edifícios de 17 andares distribuídos em sete condomínios, formatada para receber pessoas do mundo todo, com um espaço para mais de cinco mil pessoas com 700 opções gastronômicas, oferecendo ampla seleção de alimentos correspondentes aos mais diversos hábitos alimentares, culturais e religiosos de atletas de todo o mundo.

 
No mesmo local, era servida comida kosher para os judeus e halal para os muçulmanos, onde se alimentavam lado a lado. O espaço para treinamento era compartilhado entre todos, com atletas de diferentes países, biotipos e modalidades treinando juntos. Como toda cidade, a Vila Olímpica possuía praças onde muitos se encontravam para confraternizar, atletas e profissionais utilizavam as quadras esportivas, se encontravam nas piscinas e passeavam pelas áreas comuns.

 
Mas o que me chamou mais atenção foi o centro multirreligioso, que contava com espaços para as mais diversas religiões, cada uma com sua própria área que incluía materiais, livros e objetos de cultos. O local também ofereceu serviços como missas, orações, meditações, aconselhamentos espirituais, palestras e workshops para as delegações. O objetivo do centro foi promover o respeito e a compreensão entre as diferentes religiões representadas na Vila, bem como fornecer um espaço onde os atletas e membros pudessem processar a sua fé e receber suporte espiritual. Havia um clima de respeito mútuo entre as mais diferentes crenças e religiões. As Vilas Olímpicas são cidades completas, com uma sociedade com convívio multicultural, multirracial e multirreligioso, onde todos relacionam-se em comunhão mesmo com suas diferenças culturais.

 
A cultura representa a expressão da diversidade e pluralidade da condição humana. É possível conviver com as mais diferentes expressões culturais, mas qual é o limite? Até onde devemos respeitar ou até onde devemos repudiar alguma questão cultural que possa ferir direitos humanos? Ano passado foram muito discutidas as questões de gênero e de homossexualidade em relação à “cultura” do Catar e esta semana este assunto veio à tona com a imagem triste e lamentável do Dalai Lama com uma criança. Dalai Lama vive na Índia, onde, de acordo com um estudo da Comissão Nacional para a Proteção dos Direitos das Crianças, do governo indiano, cerca de 55% das crianças indianas já sofreram algum tipo de abuso, ou seja, toda brincadeira ou “cultura” que possa estimular abusos deve ser repudiada, na Índia e em qualquer outra localidade.

 
Não existe contexto, cultura ou religião que justifique o abuso infantil. É essencial proteger as crianças de qualquer comportamento inapropriado em qualquer situação. É inaceitável que, por questões culturais, aceitemos casamentos de crianças, carícias a crianças, redução de direitos e criminalização de seres humanos por apenas serem quem eles são. Não podemos relativizar o tema. Se esta luta contra culturas criminosas não houvesse acontecido, nunca as mulheres teriam os seus direitos, nem teríamos dado um basta na escravidão.

 
Que o exemplo olímpico da boa convivência entre as diferentes culturas, respeitando os princípios básicos dos direitos humanos, que eu vivenciei na Vila Olímpica, se torne uma realidade universal. Au revoir.​

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