Opinião
Dores do exílio (I)
Por Sergio Cruz Lima
Presidente da Bibliotheca Pública Pelotense
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Ao desembarcar em Lisboa, o primeiro cuidado de dom Pedro II é dirigir-se à igreja de São Vicente de Fora para rezar junto ao túmulo do pai. Por certo, o quadro daquele ancião de longas barbas brancas, alquebrado pela idade e pela doença, sobretudo pelas emoções das últimas semanas, ajoelhado junto aos restos mortais de seu pai, não deixa de ter a sua expressiva grandeza. Quase 60 anos depois que dom Pedro I fora forçado a abdicar ao trono do Brasil, seu filho, exilado como ele, agora vinha prestar-lhe a sua homenagem.
No Hotel Bragança, onde se hospeda com a família e comitiva, o imperador defenestrado recebe visitas e guarda sempre a sua natural dignidade. Não trata de política, preferindo ocupar-se sobre assuntos de arte, literatura ou ciência. Ao sair, suas visitas preferenciais são as casas de ensino ou institutos de cultura. No Convento dos Jerônimos, deposita uma coroa de flores no túmulo do amigo Alexandre Herculano. Insistentemente solicitado pelos jornalistas, recusa-se, sempre, a referir-se sobre os eventos do Brasil. Certa vez, perguntam-lhe se tenciona publicar um manifesto sobre o golpe de Estado sofrido em sua terra natal. "Para quê? O manifesto é a minha pessoa, enquanto viver", responde.
Ao tomar conhecimento da resolução do Governo Provisório, de o banir e à sua família do território nacional, a imprensa volta a indagar-lhe se não pensa em lançar um manifesto. "O meu testamento será a minha vida!", exclama. Indagado se os brasileiros reconsiderassem o ato e o chamassem, ele voltaria ao Brasil? Acudindo com vivacidade, responde: "Se me chamassem, iria; por que não?" De fato, a possibilidade de rever a pátria será sempre, nele, uma ideia fixa. De conspirações para o restabelecimento da monarquia e de sua família no trono, nem quer ouvir falar. "Conspirar jamais", observa. "A História me fará justiça, eis a minha fé consoladora".
Após 15 dias de permanência em Lisboa, quando as festas da coroação de dom Carlos como rei de Portugal se aproximam, dom Pedro não quer estorvá-las e segue para o Porto. Mas ali um novo golpe o aguarda: a morte da imperatriz Teresa Cristina, vítima de uma lesão cardíaca. Em seu diário, escreve o imperador: "Ninguém imagina a minha aflição. Choro a felicidade perdida de 46 anos. Não sei o que farei agora. Só o estudo me consolará da minha dor. Nada pode exprimir quanto perdi! Dizem que o tempo tudo desfaz. Quero ler; não posso... O que ela fez para sofrer por mim?"
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