Editorial

O indiscutível finalmente aprovado


Em algum momento de um futuro não muito distante, é provável que as gerações que sucederão os brasileiros atuais comentem espantadas o fato de que somente em maio de 2023 o Congresso Nacional tenha discutido e votado algo que sequer deveria ser motivo de controvérsia: a necessidade de qualquer pessoa ter a remuneração estabelecida de acordo com a função que exerce na organização em que trabalha. Independente do gênero com o qual se identifica. Pois foi somente ontem que tal proposta avançou na Câmara, com a aprovação por ampla maioria dos deputados – 325 a 36.

Não é nova a ideia de definir através de legislação medidas que busquem garantir igualdade de salários de homens e mulheres que venham a realizar trabalhos de igual valor ou no exercício de mesma função. Contudo, a discussão sobre o tema e a repercussão entre sindicatos, especialistas em relações trabalhistas e, principalmente, legisladores tornou-se gradativamente amplificada diante da maior conscientização social sobre os direitos das mulheres. E, este ano, ganhou novo fôlego e chegou até o plenário da Câmara por ter sido um dos compromissos de campanha da então candidata à Presidência Simone Tebet (MDB). Ao definir seu apoio a Lula (PT) no segundo turno, a emedebista definiu como uma de suas prioridades – e condição para se aliar ao petista – que um projeto de igualdade de remuneração fosse pautado entre as prioridades no começo do novo governo.

O aval ao projeto, que segue agora para análise no Senado, foi bastante exaltado por grande parte dos parlamentares, sobretudo as mulheres, apontando como pontos importantes a exigência de transparência das empresas e a fiscalização do regramento, prevendo sanções a quem descumprir a legislação.

Contudo, algumas críticas feitas à proposta durante os debates no Legislativo chamam atenção. Como por exemplo a hipótese de que empregadores, ao invés de valorizarem mulheres que estejam ganhando abaixo de seus pares do gênero masculino, passem a nivelar os vencimentos por baixo. Ou que as descrições de empregos passem a ter pequenas diferenças formais com o intuito de virem a justificar eventuais desigualdades. Ou, ainda, que tal lei, com sua fiscalização rígida, passe a ser encarada por empresas como um inibidor à contratação de trabalhadoras.

Ainda que pertinentes, os próprios empecilhos elencados mostram o quanto um tema cujo mérito é indiscutível continua cercado pela discriminação. O projeto que passou pela Câmara é um grande passo para efetivar a obviedade de que o que vale é a capacidade e contribuição do profissional à organização, não o gênero impresso na identidade ou com o qual se apresenta. Mas é preciso mais que isso. A conscientização e aplicação disso deve ser ampla e coletiva.

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