Religião

50 anos de fé e fortalecimento das origens

Pai Miguel de Aruanda é um do terreiros mais antigos do município; Tia Maruca, uma das fundadoras, segue à frente das atividades

Carlos Queiroz -

A história começou em uma pequena peça para exercer a fé entre alguns familiares, nos fundos da casa, na Santa Terezinha, em Pelotas. E lá se vão 50 anos. Criado por Anarolina Fagundes Soares, 91, o Centro de Umbanda Pai Miguel de Aruanda já foi espaço de desenvolvimento da fé das religiões de matriz africana para muitos pelotenses, ao longo dessas cinco décadas.

Ao fundo do salão, sentada em sua cadeira - destinada a mais velha -, em frente ao congá, a Tia Maruca, como é carinhosamente conhecida, recebe a reportagem do Diário Popular. É ali que a história começou e foi sendo construída desde 15 de agosto de 1972. O local decorado com balões e fitas indica a recente festa em comemoração a mais uma data de aniversário. E é ali também que retornamos ao passado, há 70 anos, através das palavras da anciã que segue acompanhada da família e de seu colar de sementes de açaí, presente do Pai Miguel.

Maruca não consegue lembrar ao certo o ano, mas era década de 1950 quando havia chegado há pouco tempo na cidade para trabalhar. Nesse meio tempo, a mãe veio a falecer. Com a dor da perda, ela sentia a necessidade de se agarrar em algo que pudesse amenizar o sentimento. E foi assim que recebeu os conselhos de um senhor de que deveria entrar em alguma religião. Começava a sua relação com a umbanda, quando entrou para o primeiro Centro.

“Eu ia em outro Centro, mas com o tempo como éramos muitos irmãos e eram muitas crianças, tínhamos muitos problemas na família e fazíamos defumação. Em uma dessas vezes eu peguei o preto velho e começamos a trabalhar, aí o preto velho pediu uma casinha para defumar cada sobrinho”, conta. “Aí que eu e minhas irmãs fizemos um local para desenvolver o trabalho. Assim, registramos o Centro Pai Miguel de Aruanda, em 1972”. Dos 10 irmãos a grande maioria já faleceu e nem todos seguiram na religião. Apenas Tia Maruca segue à frente das atividades.

Memórias e relatos que marcaram

Ao longo dessas cinco décadas, não são poucos os relatos e manifestações de fé. “Já vimos muitas curas. Teve uma senhora que veio aqui e conversou com a gente. Ela teve que ir para Santos, em São Paulo, e lá a filha estava com um problema sério e precisava fazer um cirurgia de urgência. Acabamos indo para lá, trabalhamos com a menina e ela nunca teve mais nada”.

Em frente ao conga repleto de orixás e santos, Tia Maruca ainda relembra outra história de cura. “Também teve um senhor que tinha um problema nos olhos e sempre saía muitas lágrimas. Ele tentou resolver isso indo em muitos lugares, até que veio até nós e foi indo e indo, trabalhando, acendendo velas, até que o preto velho curou ele”, compartilha.

E relembra de outros fatos que marcaram: em 1992, por exemplo, ganhou o brasão de Cidadã Pelotense da Câmara de Vereadores de Pelotas. Em outro momento esteve em Salvador, junto de um dos maiores pais-de-santo do estado baiano. “É muita coisa bonita, muita coisa boa. Tenho muito orgulho de tudo o que aconteceu, de todo trabalho que fizemos e do que fazemos há tantos anos, dentro dessa mesma sala”, reforça.

E embora não consiga estimar em torno de quantas pessoas já passaram pela corrente ao longo dessas cinco décadas, Tia Maruca tem uma convicção: ainda planeja estar bons anos, juntamente das pessoas que ama, praticando a religião. “A minha saúde está dentro desta casa. A minha vida é ajudar as pessoas e trabalhar e desenvolver a nossa religião. Aqui eu sou feliz e eu tô bem. Então, minha meta é ir até os 95 anos aqui, fazendo o que eu amo”, afirma. “Depois, aí eu já não sei”.

E quando projetam o futuro do Centro Pai Miguel de Aruanda, a filha Jociara e a neta Wanessa fazem questão de destacar que não só a família delas está envolvida diretamente. Outros irmãos de fé também criaram filhos e netos dentro daquele espaço. Para elas, portanto, o Pai Miguel de Aruanda deve seguir como local de fortalecimento das gerações e da fé que veio dos antepassados.

Saiba mais

Segundo a Federação Sul-Rio-grandense de Umbanda, a estimativa é que existam mais de 1,1 mil casas de umbanda e cultos afro em Pelotas. Desse total, 585 são filiadas à entidade. Aliado a isso, a Federação reconhece o Centro de Umbanda Pai Miguel de Aruanda como um dos mais antigos do município. Assim, a pequena casinha que começou entre familiares, passou a ser frequentada por mais pessoas e, consequentemente precisou ter o espaço aumentado - através de um apoio coletivo - entrou para história. E a escreve todas as semanas quando abre as portas ao público.

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