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Os pacientes do Hospital-Escola da Universidade Federal de Pelotas (HE-UFPel), referência em Oncologia e em HIV-Aids, passaram a contar com a linha de cuidados paliativos. A filosofia, implementada há uma década através do Programa de Internação Domiciliar Interdisciplinar (Pidi), agora será estendida também a quem está hospitalizado. É um trabalho a ser desenvolvido, lado a lado, com o tratamento curativo, fundamentado sobre dois pilares: qualidade de vida e alívio do sofrimento. Para a atuação simultânea das duas equipes, entretanto, é fundamental que as doenças não sejam diagnosticadas em estágio tão avançado.

É um dos desafios que está colocado: fazer com que os casos sejam conhecidos quando ainda exista perspectiva de cura. Se não for possível, para os profissionais especializados em cuidados paliativos, o compromisso estará recém começando. E baseado em um princípio: ainda que não se possa curar, sempre é possível cuidar. E é isso que o quarteto composto por médico, enfermeira, psicóloga e assistente social - à disposição no HE, em formato de consultoria - estará pronto para realizar, seja em parceria com os colegas que perseguem a cura do paciente ou, em quadros extremos, como o único tratamento que resta ser aplicado.

E, o principal: em ambos os casos, o doente será visto como um ser integral. Para controlar sintomas e assegurar o bem-estar, portanto, o alívio do sofrimento será encarado sob quatro aspectos: físico, psicológico, social e espiritual. Um olhar que não se volta apenas ao paciente. Os familiares, suas dores e ansiedades também viram alvo.

Uma relação de respeito e verdade
Dois princípios são essenciais na relação que se estabelece, principalmente, nos casos em que o processo de terminalidade precisa entrar em pauta: verdade e respeito. E esse respeito, às vezes, pode significar, justamente, não falar com o paciente sobre o seu prognóstico. O ideal, todavia, é que amparados no conhecimento da equipe, pacientes e familiares possam quebrar o tabu e conversar, sim, sobre a morte.

Do contrário, não raro, cria-se a chamada conspiração do silêncio, em que o tema não entra em discussão, soterrado pelo isolamento emocional - observa o coordenador da equipe de Consultoria em Cuidados paliativos da Santa Casa de Porto Alegre, o médico intensivista Rodrigo Castilho, antes de palestrar a profissionais do HE, durante a oficialização das atividades que, desde novembro, ocorriam em formato piloto. São oportunidades, portanto, a agarrar: reconciliações. Abraços. Perdões.

“Temos o compromisso de tratar a vida com qualidade até a morte”, enfatiza a chefe da Divisão de Gestão do Cuidado, Isabel Arrieira. E mais: é preciso enxergar a morte como parte da vida - acrescenta a enfermeira.

Confiança e entusiasmo
O motorista Vanildo dos Santos, 60, está internado, mas nem parece. O clima é de contagem regressiva para o próximo baile da Terceira Idade; uma agenda que o faz percorrer, ao lado da mulher Ivonete, vários municípios da Zona Sul. “Viajamos toda a região levando idosos para os bailes”, conta. E se motiva para também deslizar os pés pelos salões, a cada evento. É uma razão a mais para recompor a saúde - admite o pelotense, em tratamento de câncer desde 2012.

“O doutor Fábio e a equipe dele (de Cuidados Paliativos) foram mexendo e ajustando os meus remédios até aliviar a dor que eu tinha. Em casa, chegava a estar abaixo de morfina”. Resultado do câncer que começou na próstata e provocou metástases à parte óssea. Mas, acima de tudo, disseminou uma lição: “Não adianta querer me entregar. Nenhum médico vai fazer milagre se eu não lutar”. É um ânimo que Vanildo tem procurado alimentar. Enquanto tratava a infecção urinária - comum em pacientes que utilizam sondas -, na última sexta-feira, voltava o foco à alegria que estava por vir, do lado de fora: com a esposa, filhos e neto e com os vários bailes que estão por vir.

O que é o cuidado paliativo?
Desde 2002, a Organização Mundial de Saúde (OMS) definiu o cuidado paliativo como uma abordagem que promove qualidade de vida ao paciente portador de doença grave, ameaçadora à vida; não necessariamente câncer.
Todas as pessoas que apresentam doença com pouca ou nenhuma resposta à terapêutica curativa e com sintomas de sofrimento, como em casos também de Aids e doenças neurológicas crônicas, doenças cardíacas, pulmonares ou renais, por exemplo, devem receber esse suporte.

Receber os cuidados paliativos significa abrir mão do tratamento da sua doença?
Não. Estar em cuidados paliativos não significa ser privado dos recursos diagnósticos e terapêuticos que a medicina pode oferecer.
Os cuidados são administrados juntamente com o tratamento específico da doença.
Quando o tratamento curativo, entretanto, já não responde, os cuidados paliativos se tornam o foco central da assistência e passam a ser administrados para aliviar os sintomas e outros problemas decorrentes da doença.

Hospice deve inaugurar até o final de junho
O Centro Regional de Cuidados Paliativos, o Hospice, deve inaugurar até o final deste primeiro semestre. Ao menos é a nova previsão da direção do Hospital-Escola, que tem lidado com atraso nas obras, correria atrás de recursos e alterações no projeto, que agora conta com elevador e subestação de energia elétrica. A estimativa é de que o valor final beire os R$ 3 milhões; um acréscimo de 50%.
Ao inaugurar, a unidade - que funcionará no prédio da antiga Laneira - não irá alterar em nada a filosofia, hoje, estendida ao HE. Pelo contrário. Será uma estrutura a mais à disposição da comunidade, sob uma mesma orientação, e a equipe de Consultoria deverá servir de elo entre o Hospice, o Hospital-Escola e os dois programas de internação domiciliar: o Pidi e o Melhor em Casa - ressalta a superintendente Julieta Fripp.
A expectativa, portanto, é pelo fim das obras, já que a previsão inicial era de que as atividades pudessem começar até o final de 2014. Uma estrutura que garantirá ainda mais qualidade ao atendimento, 100% SUS. A área de 900 metros quadrados contará com 16 leitos de internação, área de convivência de pacientes e familiares, postos de enfermagem, salas de procedimentos, sala de reunião de equipe, auditório, almoxarifado, copa-cozinha, lavanderia e garagem. E, para colocá-la em operação, a retaguarda de pessoal está garantida. O concurso público da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh) já levou em consideração a próxima unidade em funcionamento.

Como vai funcionar o trabalho?
* O atendimento será realizado através de consultoria. Uma equipe interdisciplinar, composta por médico, enfermeira, psicóloga e assistente social, estará pronta para ser acionada e, à disposição, para três tipos de situação:

1- Avaliar e acompanhar pacientes (e familiares), com o objetivo de cuidar dos sintomas físicos de desconforto, como dor, fadiga, cansaço, falta de ar e outros que possam causar sofrimento e piora da qualidade de vida.

2- Abordar as necessidades emocionais, sociais, familiares e espirituais do paciente e de sua família, alicerçados em um princípio: respeitar valores e crenças.

3- Sugerir aos colegas, da equipe assistencial (dedicada ao tratamento curativo), plano de cuidados dirigido a pacientes e familiares.

Quem integra a equipe?

Médico: Fábio de Moura Pinto
Enfermeira: Ana Cristina Fonseca
Psicóloga: Taís Leivas
Assistente social: Simone Sanghi

Os princípios do cuidado paliativo
# Avaliar antes de tratar;
# Explicar as causas dos sintomas;
# Não esperar que o doente se queixe
# Adotar estratégia terapêutica mista, sempre que possível (junto à equipe responsável pelo tratamento curativo);
# Monitorar os sintomas;
# Reavaliar regularmente as medidas terapêuticas;
# Cuidar dos detalhes;
# Estar disponível

Conheça o HE

#Quatro grandes áreas de atendimento: Cirurgia, Clínica Médica, Pediatria e Ginecologia
# Referência em Oncologia e em HIV-Aids
# Total de leitos: 174
# Fluxo de internações/mês: 500
# Dois programas de internação domiciliar: o Pidi (com 20 pacientes) e o Melhor em Casa (com até 130 pacientes concomitantes). O trabalho, realizado por oito equipes, adota a linha de Cuidados Paliativos. Ambos serviram de referência ao serviço, agora, estendido ao hospital.

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