Queixa

Gestantes reclamam do atendimento

Mulheres com complicações na gravidez afirmam que não recebem suporte adequado à noite e aos finais de semana na rede pública em Pelotas

Era madrugada do último dia 24, um sábado, quando Raquel de Castro percebeu que algo não estava bem. Com seis semanas de gestação, a manicure se assustou ao perceber o sangramento e, com o apoio da irmã Joice, correu para o Pronto-Socorro. Porém, ao invés de encontrar acolhimento e tranquilidade, viveu o que tem se repetido com muitas mulheres grávidas em Pelotas: a falta de assistência médica apropriada à noite e aos finais de semana.

Aos 28 anos anos e já mãe de um menino de nove anos, Raquel conta que percebeu o risco que sua gravidez de gêmeos poderia estar correndo. No entanto, quando ela e a irmã chegaram ao PS, ficaram surpresas. Mesmo assustada e com hemorragia, a gestante foi informada de que não seria encaminhada a um dos dois hospitais de referência para exames.

“Me disseram que no Hospital Universitário São Francisco de Paula (HUSFP) não havia ginecologista de plantão e no Hospital-Escola da Universidade Federal de Pelotas (HE-UFPel) eu só poderia ir se a gestação tivesse pelo menos 24 semanas.”

Raquel lembra que o clínico geral de plantão no PS lamentou a situação e, após verificar se a sua situação era estável, pediu que repousasse em casa, já que não haveria possibilidade de aborto. Com o sangramento persistindo durante todo o final de semana, ela retornou ao PS na segunda-feira. “Mais uma vez afirmaram que não havia risco”, conta.

Inconformada, a gestante optou por consultar no dia seguinte uma especialista em Porto Alegre, que fez o diagnóstico: um dos gêmeos já estava sem vida. “Foi um trauma. Me senti excluída, como se minha gravidez, por ter menos de 24 semanas, não tivesse importância. Eu já tinha até ouvido o coraçãozinho”, lamenta, abalada, enquanto aguarda para o próximo dia 19 uma consulta com uma ginecologista na Unidade Básica de Saúde (UBS) da Cohab Pestano.

O caso de Raquel não é o único a expor o sofrimento a que futuras mães encontram para ter acesso à atenção e encaminhamento na rede pública de Pelotas em casos de urgência e emergência. A reportagem do Diário Popular entrou em contato com a Central de Regulação da Secretaria Municipal de Saúde (SMS), mas recebeu como resposta que fatos assim não são comuns.

Sem querer entrar em detalhes sobre os atendimentos, a gerente da Central, enfermeira Aline Machado da Silva, disse que só poderia apontar se há falhas ou não no protocolo de atendimento se tivesse conhecimento dos casos. Porém, ressalta que não há registros de problemas e que o Pronto Atendimento Ginecológico funciona nos turnos da manhã e da tarde durante a semana no HUSFP. Além disso, garantiu que mulheres com 24 semanas ou mais de gravidez têm atendimento 24 horas, todos os dias da semana.

Falta orientação
Embora o período após as 18h e os sábados e domingos sejam os mais críticos para atendimento a gestações de alto risco, há casos de falta de encaminhamento também durante a semana. A dona de casa Renata Rodrigues, 30, afirma que perdeu aquele que seria o seu terceiro filho após recorrer à rede pública, há cerca de um ano.

“Acordei com dor e sangramento por volta das 8h de uma terça-feira. Estava com 11 semanas. Fui à UBS Bom Jesus, que me mandou ao PS e ali fui encaminhada ao São Francisco. Uma médica me pediu um ultrassom, particular, que eu não tinha como pagar naquele momento”, conta. Sem saber o que fazer, bateu à porta do HE, onde não teria recebido atendimento por estar com menos de 24 semanas de gravidez. Desesperada, recorreu a uma clínica particular, mas quando foi atendida o bebê já estava sem batimentos. “Fui obrigada a retornar ao HUSFP no dia seguinte para induzir o aborto. Faltou informar, encaminhar da forma correta. Estava em uma situação delicada e não recebi apoio e orientação”, reclama.

Segundo a secretária de Saúde, não há registros de pacientes que tenham deixado de ser atendidas adequadamente. Ana Costa aponta que sempre que é constatada a necessidade de exames a equipe médica faz a solicitação, inclusive à Maternidade do HUSFP. Já a diretora técnica do PS, Rosana van der Laan, afirma que todos os casos são atendidos conforme o protocolo. Ela diz que o local possui equipamento para exames e técnico ultrassonografista. No entanto, a escolha sobre o procedimento cabe ao médico plantonista.

Como funciona o atendimento
De segunda a sexta, das 8h às 18h, todas as gestantes com alguma complicação podem ser atendidas em qualquer UBS, na UPA Ferreira Viana e na Ubai Navegantes. Aos finais de semana e após as 18h, o caminho é diretamente o Pronto-Socorro. Ao chegar ao PS, a classificação e o fluxo de atendimento são definidos conforme o período de gestação:

Até 20 semanas
Durante a semana em horários comerciais, os casos são analisados e, se necessário, encaminhados ao Pronto Atendimento Ginecológico. Se a atenção for necessária após as 18h ou aos finais de semana, UPA, Ubai ou diretamente o PS são as opções 24 horas. A médica do PS Rosana van der Laan afirma que, em caso de risco, as mães são estabilizadas e levadas ao serviço de obstetrícia para assistência.

De acordo com o professor do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da UFPel, Guilherme Bicca, para ter certeza sobre uma eventual interrupção na gravidez em casos de sangramento como os citados na reportagem é preciso a realização de exames específicos, como a ultrassonografia. “O ideal é que isso ocorra sempre nestes casos. Mas sabemos que é difícil termos, inclusive na rede privada, técnicos plantonistas especializados para a operação do ultrassom. Essa é uma falha que, somada à falta de um acolhimento mais adequado, prejudica o atendimento às pacientes”, explica.

Entre 20 e 23 semanas
Conforme a classificação feita no PS, possuem atendimento 24 horas garantido no Hospital-Escola da UFPel.

A partir de 24 semanas
Também de acordo com a classificação, são direcionadas ao HE-UFPel ou à maternidade do HUSFP.

Onde está o problema
De acordo com o professor do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da UFPel, Guilherme Bicca, para ter certeza sobre uma eventual interrupção na gravidez em casos de sangramento como os citados na reportagem é preciso a realização de exames específicos, como a ultrassonografia. “O ideal é que isso ocorra sempre nestes casos. Mas sabemos que é difícil termos, inclusive na rede privada, técnicos plantonistas especializados para a operação do ultrassom. Essa é uma falha que, somada à falta de um acolhimento mais adequado, prejudica o atendimento às pacientes”, explica.

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