Pesquisa
Passado é redescoberto em sítios arqueológicos
Cinco áreas com vestígios pré-históricos de tribos Charrua e Minuano são identificadas durante a construção da ETA São Gonçalo
Cinco sítios arqueológicos foram encontrados no entorno imediato à construção da Estação de Tratamento de Água São Gonçalo, à beira do canal, próximo ao Campus Capão do Leão da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), até o canal Santa Bárbara. São cerritos pré-históricos que indicam ter havido ocupação indígena das tribos Charrua e Minuano, conforme montículos observados e materiais cerâmicos, ósseos e líticos encontrados nos locais por meio das prospecções intensivas. Foram feitas sondagens de superfície e análise visual do ambiente.
Os sítios receberam as denominações de Moreira I, Moreira II, Pavão 1, Pavão 2 e Pavão 3. Em atendimento à determinação do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), os espaços foram demarcados e devem ser preservados, segundo informa um dos arqueólogos responsáveis pelo Instituto de Memória e Patrimônio, Jorge Viana. Ele destaca que o Sanep cumpriu a Lei 3.924, que estabelece a não destruição de nenhuma jazida arqueológica, sob qualquer argumento.
Foram feitos estudos e várias intervenções que identificaram os sítios. Eles não estão diretamente na linha da adutora, mas farão com que a obra seja desviada em 300 metros. O Iphan se posicionou quanto ao salvamento parcial (45%) do Moreira I, mas todos deverão continuar cercados. Os sítios estão no entorno imediato do início da tubulação e chegam quase até o canal Santa Bárbara, em uma região rica em recursos hídricos. O Sanep vai licitar a realização de um plano de gestão educativa na parte do Moreira I liberada pelo Iphan.
O diretor-presidente da autarquia, Jacques Reydams, salienta que o desvio exigido pelo Iphan custará mais R$ 1,8 milhão à construção da ETA, orçada inicialmente em R$ 28 milhões, mais R$ 9 milhões para aquisição dos tubos. Ocorre que não foi esse o único problema encontrado e a obra deverá ser onerada em mais de R$ 7 milhões a R$ 10 milhões, recursos que o Sanep e a prefeitura terão de aportar para dar continuidade aos trabalhos. "É uma engenharia financeira que vamos ter de fazer para continuar a obra", comenta Reydams.
A questão dos sítios arqueológicas é apenas uma no universo de entraves que o Sanep tem esbarrado. O Reservatório R1, na praça Piratinino de Almeida, é fundamental para o funcionamento da ETA e na obra de recuperação houve comprometimento da estrutura, que terá de ser revista. Além disso, é preciso reequilibrar o orçamento defasado de 2013 para enfrentar reajustes. Outra barreira: a transposição do Arroio Fragata, que pelo projeto original resultou em uma metragem seis vezes inferior ao real comprimento, o que significa mais R$ 800 mil. "Vários itens não foram considerados", acrescenta Reydams.
Relatório
De acordo com o relatório de diagnóstico interventivo e prospecção arqueológica intensiva para a obra da ETA, feito pelo Instituto de Memória e Patrimônio, os assentamentos de charruas e minuanos eram pequenos, com cabanas unifamiliares, associados aos chamados cerritos, pequenos montes cujas diversidades de funções ainda hoje são estudadas, mas provavelmente se destinavam a dar uma base seca em áreas alagadiças para o estabelecimento dos acampamentos.
Os cerritos identificados em Pelotas e Capão do Leão não ultrapassavam dois metros de altura. Os grupos indígenas caracterizavam-se como caçadores, pescadores e coletores, assim como conheciam algo de cultivo. Segundo os arqueólogos Jorge Viana e Luciana Peixoto, diferentemente de outras tribos, não se deixaram submeter às diversas formas de aldeamento e redução por parte dos colonizadores europeus e missionários jesuítas.
Mais escavações
O Consórcio Enfil Ônix realiza as obras e deu início às escavações na última segunda-feira à tarde, na praça 20 de Setembro. O trabalho também será acompanhado por arqueólogo para o caso de identificar algum sítio arqueológico, explica o engenheiro civil da Enfil S.A/Controle Ambiental, Saleiman Andraus. A construção da ETA São Gonçalo chega atualmente a 47% do total da obra e 75% da parte civil. Gera 75 empregos diretos.
Estrutura
O reservatório vai tratar quatro mil metros cúbicos de água (equivalente a quatro milhões de litros) e terá capacidade para abastecer 170 mil consumidores, com possibilidade de liberar 500 litros por segundo. As obras iniciaram-se em julho de 2015 e devem ser finalizadas em 2017, segundo projeção do Sanep.
Estudos da UFPel
Dois sítios arqueológicos - Pavão I e Pavão II - serão pesquisados detalhadamente para um trabalho de mestrado da UFPel. A ideia é iniciar as escavações no final do ano, mas o arqueólogo Jorge Viana acredita que isso só deverá ser possível no verão, por ser uma estação mais quente e menos chuvosa. Com a grande quantidade de precipitação registrada nos últimos dias em Pelotas, nem mesmo os caminhões da Enfil conseguem trafegar até os espaços demarcados, pois a Lagoa do Fragata transbordou e encharcou os pontos, localizados em banhados.
Em 2014 foi feito o trabalho de dissertação intitulado Mapeamento arqueológico dos cerritos da Lagoa do Fragata, Pelotas e Capão do Leão, por Mateus Guedes Peçanha. Ele abordou os cerritos de índios, explicando se tratar de estruturas monticulares de origem antrópica com composições características de algumas populações indígenas que habitaram o Bioma Pampa no Sul da América do Sul desde o período pré-colonial.
A dissertação teve por propósito central mapear as ocorrências arqueológicas desse tipo, localizadas na região da Lagoa do Fragata, na bacia hidrográfica da Laguna dos Patos, entre os municípios de Pelotas e Capão do Leão. Nessa região de formação sedimentar, inserida na bacia hidrográfica da Laguna dos Patos, mais precisamente na várzea do canal São Gonçalo, segundo o trabalho, foram identificados sete sítios arqueológicos. A equipe do Laboratório de Ensino e Pesquisa em Antropologia e Arqueologia da UFPel (Lepaarq) também pesquisa escavações arqueológicas em cerritos de índios, trabalho realizado na margem do canal São Gonçalo e banhado da Lagoa do Fragata, em Capão do Leão.
Carregando matéria
Conteúdo exclusivo!
Somente assinantes podem visualizar este conteúdo
clique aqui para verificar os planos disponíveis
Já sou assinante
Deixe seu comentário