Patrimônio

Uma casa histórica e útil para a sociedade pelotense

Uma das primeiras residências do município, na Major Cícero, 201, deverá ser restaurada para abrigar o Banco Madre Tereza de Calcutá

Jerônimo Gonzalez -

As casas antigas, principalmente numa cidade como Pelotas, têm sua importância histórica e é interessante passar em frente a uma e imaginar o que acontecia dentro daquelas paredes há cem, duzentos anos. Mas é tão importante quanto não deixá-las apenas no campo da nostalgia, do olhar para trás, fazer delas tetos úteis tanto tempo depois. Uma das primeiras residências de Pelotas, localizada na Major Cícero entre Anchieta e Félix da Cunha, está prestes a ser ressignificada dessa forma. O Banco de Alimentos Madre Tereza de Calcutá, a quem ela foi repassada em comodato de 30 anos, aguarda liberação da Secretaria de Cultura (Secult) para buscar recursos a fim de restaurá-la.

A instituição foi inaugurada em 6 de julho de 2003 através da união da então Diocese de Pelotas com o Mutirão para a Superação da Fome e da Miséria. Seu trabalho é organizar a coleta e a distribuição de alimentos, roupas, remédios e litros de leite, além de realizar cursos profissionalizantes de doméstica(o), cozinheira(o), garçonete/garçom e básico de informática.

A atual sede é na avenida Fernando Osório, 1.280, mas, com o crescimento da proposta, tornou-se complicado abrigar lá tantas ações simultâneas, ao que há três anos a Sociedade São Vicente de Paula, que obtinha a casa tida como a mais antiga da cidade, a repassou para que, após reconstruída, abrigasse o banco.
A coordenadora geral da instituição, Maria Eulalie Assumpção Mello Fernandes, conta que a ideia é recuperar o local. Devagar, se preciso for, mas recuperá-lo. Para tal, um projeto foi elaborado, “com muita gentileza”, pela arquiteta Elenice Porto junto do engenheiro Jorge Duarte, oriundo de Pinheiro Machado.
Segundo Maria Eulalie, o fato de a casa, inventariada, ter histórica beleza, bem como muita memória, é interessante, mas ao mesmo tempo representa desafios. “Encarece muito a obra, pois estamos buscando fazer um restauro que guarde todas as características originais. Estamos há três anos com o comodato e ainda não saímos do chão”, lamenta.

A esperança, porém, reacendeu quando o projeto foi levado há um mês à Secult, onde se encontra em regime de apreciação e, caso seja aprovado, permitirá ao Madre Tereza de Calcutá ter acesso a editais de financiamento e incentivo fiscal como a Lei Rouanet. “Esperamos o sim dentro de trinta dias para que possamos dar o andamento à obra. Pretendemos fazer um lançamento bonito, convidando pessoas que estejam interessadas em devagarinho reconstruí-la conosco”, comenta a coordenadora. “Com a aprovação e o projeto iniciará. Colocaremos tapumes, amarraremos as paredes, que ameaçam cair. É uma construção antiga, que precisa de uma madeira de qualidade. Tudo faremos conforme nos for solicitado”, completa.
Maria Eulalie explica que a ideia é que das cinco frentes em que o banco trabalha hoje em dia - alimentos, leite, remédios, roupas e empregos - apenas o primeiro seguirá na sede vigente, por questões de logística. Com 15 toneladas de comida sendo distribuídas mensalmente, é preferível que o atual espaço siga sendo utilizado, por ser menos central e mais espaçoso, se utilizado exclusivamente para isso. As outras quatro migrariam para a casa na Major Cícero.

Para o banco de empregos, em especial, os planos são maiores: destinar uma sala exclusiva para realizar todos os cursos, de forma interdisciplinar. “Queremos fazer da mesma sala o local de vários cursos, apenas adaptando para cada aula”, explica.

Ideal
Para Maria Eulalie, a utilização da histórica casa de uma forma que beneficie a sociedade é o uso ideal. “É o lugar onde nasceu a cidade. Ela é um marco. Agora com destino social, atendendo quem mais precisa. Acho que Deus tinha um plano muito bonito para ela”, comenta. O Banco Madre Tereza de Calcutá, somando todas as suas ações, atende de oito a dez mil pessoas por mês.

História
Conhecido como A Casa dos Torres, o imóvel com o número 201, localizado na Major Cícero e hoje sem telhados e com paredes deterioradas, era descrita pelo historiador Mário Osório Magalhães como “a bússola de Pelotas”. Conta ele, em artigo publicado no Diário Popular no dia 4 de julho de 2004, que uma reivindicação de fiéis que moravam ao norte do canal São Gonçalo resultou na criação de uma freguesia junto à Corte do Rio de Janeiro.

Surgiu então a Freguesia de São Francisco de Paula, ao que era necessária a escolha de um terreno para que fosse construída a igreja-sede da nova localidade. Durante cinco meses os encontros para decidir a questão aconteceram na casa de Antônio José Torres, pertencente anteriormente às instalações da charqueada de José Aguiar Peixoto na sequência sendo repassada ao capitão-mor Antônio Francisco dos Anjos.

Ainda segundo o historiador, a moradia não serviu apenas como sede de tais reuniões, mas também como marco referencial para a escolha de onde a igreja - hoje Catedral São Francisco de Paula - seria construída, bem como o arruamento que se desenvolveria no entorno.

Autor do livro O processo de urbanização de Pelotas e a fazenda do Arroio Moreira, o historiador e pesquisador Adão Monquelat, entretanto, diz não ser possível dizer que a residência fora de fato a primeira da cidade. “Eu, por falta de provas, não faria tal afirmação muito embora nunca me preocupei com essas primazias e pioneirismos que a cidade tanto gosta.” Ele é da opinião de que a Pelotas urbana é fruto da aforação de terras feita por Antônio dos Anjos com o objetivo de obter uma renda anual e perpétua. A Casa dos Torres seria um destes lotes adquiridos.

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