Sandro Mesquita
A cidade é nossa
Por Sandro Mesquita
Coordenador da Central Única das Favelas (Cufa) Pelotas e Extremo Sul
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As pautas sociais estão sempre em baila com sociedade civil organizada e instituições ligadas às temáticas e governamentais. São tantas coisas a se debater, pautar e buscar esclarecimentos, entendimentos, soluções e que estão na nossa frente, tantas coisas que foram acentuadas com o período mais crítico que passamos.
Algumas situações e problemas infelizmente trazem um sentimento de não pertencimento, ou seja, pessoas que por não terem os serviços básicos atendidos não constroem esse sentimento, e que é importante para que haja uma aliança no cuidado da Princesa Preta.
Vou utilizar um título, o nome de uma programação radiofônica que me veio à cabeça que era da rádio Tupanci que se chamava "A cidade é nossa" e como, eu era um jovem há pouco tempo, tinha o sonho de conquistar de fato a cidade e tudo que pudesse conquistar, assim como várias pessoas sempre quiseram.
Entre tantos desejos acredito que um básico que é comum a todos é de ter uma casa para morar, um local onde você possa retornar e descansar após um dia de trabalho, o direito à moradia. Embora visualizamos algumas poucas ações nesse sentido, poucas políticas habitacionais que atendam a demanda e que cumpram um papel de inclusão de todos proporcionalmente, ainda acabam sendo uma questão secundária.
Acredito ficar bem difícil, mas não impossível, distribuir terras e criar políticas habitacionais sem romper com o interesse da especulação imobiliária e a quebra da acumulação de terra, lei que foi estabelecida em 1850, tanto para criar essa apropriação fundiária, como para deixar grande parte da população que estaria 38 anos depois sendo "libertada" no papel, em outra legislação que dava somente a liberdade como quem fazia as leis queria, sem dar conta de como àquelas iriam recomeçar suas vidas sem um pedaço de chão.
Quando se é levantada a pauta por direito à moradia, eu associo ao direito à cidade, pois você não só mora, mas tem suas atividades voltadas para outros locais às vezes distantes do seu local de moradia, criando outras relações sociais como: o trabalho, a escola, a saúde, o lazer, acessibilidade, comercial, enfim, não se está confinado às quatro paredes onde habitamos. Geralmente quando perguntados onde moramos respondemos a localidade e não a localização.
Eu, por exemplo, sempre respondo que moro no bairro Navegantes, hoje conhecida por bairro São Gonçalo e, em um segundo momento digo o meu endereço. E isso nós dá a dimensão, ou deveria dar, da nossa relação com o local de moradia, seus habitantes nossos vizinhos, toda a interação com nosso habitat como também suas problemáticas. Por isso, quando estamos falando de direito à moradia, estamos falando de um complexo de situação que transcendem as aberturas das nossas casas, embora alguns habitem e dormem conosco.
Na saída da nossa casa/moradia já temos que lidar com a questão do esgoto a céu aberto, convivência com a vizinhança e seus códigos, sistema de transporte, estrutura das escolas, do postinho, do Cras e forma de atendimento, espaços de lazer pra família e juventude, praças, poliesportivos, serviços como farmácias, bancos etc..
Construir um projeto de cidade, um projeto de moradia digna com infraestrutura desenhada que comporte as famílias com seu contingente, espaços de convivência para todos, não deve ser uma tarefa muito fácil, mas deve ser uma tarefa feita por todos, todos os setores dispostos e a população mais interessada por ter suas necessidades atendidas, pelo direito de ser, de existir e como forma de equiparar as distorções em forma de lei concebidas no passado.
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