João Neutzling Jr

Bophal, uma tragédia esquecida

Por João Neutzling Jr.
Economista, mestre em Educação, auditor estadual, pesquisador e professor
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Na noite de 2 de dezembro de 1984, há 38 anos, na cidade de Bophal, estado de Madia Pradexe, Índia, a fábrica da Union Carbide Limited (multinacional americana) deixou vazar mais de 75 metros cúbicos de gás isocianato de metila, substância gasosa altamente tóxica usada na produção de pesticidas. Como resultado, mais de 400 mil pessoas foram contaminadas pelo gás que se espalhou por uma distância de dezenas de quilômetros da fábrica.

Os gases provocaram queimaduras nos olhos, intoxicação nos pulmões e alteração no sistema nervoso. Muitas pessoas morreram dormindo. Outras se acordaram e saíram correndo pela rua escura em busca de socorro e logo caíam ao chão e morriam intoxicadas. As ambulâncias não conseguiam atender a demanda e os necrotérios e hospitais ficaram lotados de vítimas. Não havia médicos disponíveis para tamanha catástrofe.

Morreram crianças, bebês, jovens e idosos. Na primeira semana morreram mais de três mil pessoas. O número de infectados foi aumentando com o tempo. Em duas semanas já haviam morrido mais de 15 mil pessoas. Milhares de gestantes tiveram abortos por causa do gás.

A Union Carbide se negou a fornecer informações detalhadas sobre a natureza dos gases e, como consequência, os médicos não tiveram condições de tratar adequadamente as vítimas. A preliminar indenização média, de 500 dólares por pessoa, era suficiente apenas para cobrir despesas médicas por pouco tempo. Muitas das vítimas, assim como seus filhos, sofrerão os efeitos do desastre pelo resto de suas vidas.

A agricultura, pesca e pecuária ficaram impedidas por mais de um século na área próxima da fábrica por causa da contaminação do solo. A fábrica da U.C. permaneceu abandonada desde a explosão tóxica, enquanto que resíduos perigosos e materiais contaminados ainda ficaram espalhados pela área, atingindo solo e águas subterrâneas no entorno da fábrica. Hoje, mais de 250 mil sobreviventes ainda sofrem com efeitos secundários da intoxicação como cegueira, doença pulmonar e do sistema nervoso.

O Tribunal de Justiça da Índia, que julgou o caso, considerou a indústria responsável pela contaminação do ar e do solo, exigindo uma indenização de mais 200 milhões de dólares que nunca foi paga.

Em 2001 a Union Carbide foi incorporada pela Dow Chemical Company dos Estados Unidos. Portanto, ao adquirir os ativos, também adquiriu os passivos trabalhista e ambiental, mas a Dow se recusou sistematicamente a pagar qualquer indenização. Processos judicias contra a Dow nas cortes americanas foram infrutíferos.

Quando a indústria operava em normalidade o lucro era privatizado, mas quando ocorreu o acidente toda a despesa imprevista foi repassada para o governo indiano, ou seja, socializado o prejuízo. O filme Bhopal: a prayer for rain (Bhopal: uma oração pela chuva), com o ator Martin Sheen, de 2014, retrata o acidente de forma bem realista. Entre as causas do acidente, a falta de uma ação fiscalizadora estatal na área de meio ambiente e controle de poluição, ou seja, o estado mínimo.

Foi um dos maiores crimes industriais da história, impune até hoje.​

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