Opinião
Cara Literatura: para onde foram os risos?
Por Eduardo Ritter
Professor do Centro de Letras e Comunicação da UFPel
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Literatura é assunto sério, mas nem sempre precisa ser séria. É sobre isso que me referia ao encerrar a coluna da última semana, quando escrevi que sempre que o assunto é literatura a impressão que tenho é que aqui, no Brasil, ficamos cada vez mais conservadores. Senti isso quando visitei as feiras do livro de Porto Alegre e de Pelotas e em todas as bancas estavam destacadas as obras mais vendidas e os últimos lançamentos e percebi que apenas visualizava capas estampando temas relacionados às mais variadas problemáticas. Mesmo nos romances, temas como educação, sociologia, psicologia, economia e problemas sociais em geral eram os grandes protagonistas. Óbvio que todas essas são temáticas importantes para a literatura, mas também há espaço para o humor e outras bobagens.
Examinando demoradamente praticamente cada uma das bancas, fiquei me questionando: cadê os Kerouacs, Bukowskis, Davids Coimbras, Juans Gutierrezes, Garbrielas Wieners e Henrys Müllers da vida? Há uma década, lembro que descobria pérolas divertidas da literatura percorrendo as bancas, como certa vez achei "Martin Eden", de Jack London, na feira de Porto Alegre, e "Fé na estrada", de Dodô Azevedo, na feira de Pelotas. Neste ano, procurando algo mais descontraído, encontrei apenas narrativas de autores já manjados, como os citados anteriormente. Já os livros destacados de autores contemporâneos eram todos sobre temáticas sérias, sérias demais, pra falar a verdade.
Zanzando pelas duas feiras, lembrei ainda que eu tenho um romance cheio de bobagens engavetado há maios de ano e que já foi rejeitado por umas quatro ou cinco editoras. Logo concluí: as editoras não querem isso. Elas querem livros politicamente corretos, que vão agradar tanto conservadores de direita, quanto os de esquerda (sim, a esquerda quando quer ser conservadora, sai de baixo!). Autores que simplesmente falam da imperfeição humana, geralmente com doses de humor e com um estilo mais próximo do entretenimento, estão fora de moda. Um Caio Fernando Abreu ou um John Fante não teriam vez hoje em dia. Para a direita, eles são pagãos que vão contra a moral e os bons costumes. Para a esquerda eles são "outrofóbicos". Ainda bem que nasceram em outro tempo e publicaram as suas obras, pois sempre acabo recorrendo a elas quando procuro textos para espairecer no meio de tantas leituras "sérias". Inclusive, já pedi para o Papai Noel a obra "Os Dragões Não Conhecem o Paraíso", do Caio Fernando. Enfim, estou sempre recorrendo aos mesmos.
Eu poderia perguntar: onde estão os autores engraçados e criativos de hoje em dia? Pois tenho a resposta: estão por aí, ou sendo rejeitados por editoras, ou escondidos, com medo das pedras do público conservador de direita e de esquerda. Público que gosta de abordar a "problemática", mas que nunca apresenta "solucionática". Para esse público, dou a mesma resposta do ex-jogador e filósofo Dadá Maravilha: "não venha com a problemática que eu tenho a solucionática", acrescentando que a solucionática, muitas vezes, pode ser um bom livro que te faça refletir e rir ao mesmo tempo, como fazia velho e bom analista de Bagé, de Luis Vernando Verissimo: dando um joelhaço no conservadorismo e no mau humor.
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