Editorial

Desdém

Há uma velha máxima, jocosa, mas com fundo de verdade, de que uma pessoa pode, com o tempo, mudar de convicções políticas, religiosas, amorosas, mas jamais futebolísticas. E é mesmo. O torcedor mantém-se fiel, esteja o time erguendo o maior dos troféus, esteja ele na maior seca possível em um fundo de poço. No fim, o torcedor é sempre igual: seja o espanhol que vive a eterna lua de mel que é torcer para o Real Madrid, seja o sofrido torcedor de algum time viver uma sequência de anos terríveis, a paixão é sempre a mesma. Por vezes até mais forte nos momentos ruins, quando o vínculo se estreita ainda mais.

No entanto, cada vez mais essa dedicação máxima fica apenas na arquibancada. O que se vê nas últimas notícias das editorias de esportes, com escândalos de manipulação envolvendo apostadores e atletas, é de desmotivar até o mais fiel dos fãs. Afinal, como confiar, agora, em quem veste a camisa? Há idoneidade? A reportagem da edição de final de semana do Diário Popular, em que Gustavo Pereira e Fernando Rascado destrincham o tema, deixa um gosto amargo na boca de quem ama o futebol. São 15 partidas, 53 atletas, fora o que não se sabe. Essas primeiras denúncias parecem ser apenas a ponta do iceberg. Isso em uma operação específica, já que há outras, que batem na nossa porta, como a que envolveu atletas do Farroupilha no ano passado.

O desdém com que alguns atletas tratam o esporte é o que mais entristece. Nas conversas expostas pelos investigadores, até chamada de vídeo feita de dentro do vestiário aconteceu. O zagueiro Gutierrez, do Brasil, foi sensível em pontuar em coletiva que estes atletas têm a oportunidade que muitos sonham e se mancham por pouco. É outro fato terrível para quem ama o esporte.

Com o escândalo, o assunto de casas de apostas volta à luz. Muitos criticam que presença maciça delas no esporte, patrocinando clubes, atletas, federações, campeonatos e até a imprensa atrai essa máfia. Outros defendem que elas são vítimas, já que os resultados arranjados sangram diretamente os cofres delas. O governo se mexe para achar uma maneira de regulamentar o formato, mas não parece haver uma saída para vedar a corrupção, já que ocorre à margem das empresas e da lei, como é naturalmente de qualquer contravenção.

Resta, a quem é apaixonado e a quem acredita em um mundo mais limpo, torcer para que essa investigação resulte em punições exemplares para que a lisura do esporte resista de alguma maneira, se é que ainda é possível.


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