Artigo

Não é corrida de obstáculos, é vida real

"Na abertura oficial da Fenadoce, que ocorreu recentemente, fiz um desabafo que surpreendeu muitas pessoas"

Por Paula Mascarenhas
Prefeita de Pelotas

Na abertura oficial da Fenadoce, que ocorreu recentemente, fiz um desabafo que surpreendeu muitas pessoas. Naquele mesmo dia, estive no Congresso da Federação das Associações de Municípios do Rio Grande do Sul (Famurs), em Restinga Sêca, onde recebemos o primeiro lugar, na nossa categoria, do prêmio de Governança Municipal, promovido pelos Conselhos Federal e Regional de Administração. Isso deveria ser motivo de grande satisfação para mim e para toda a equipe da Prefeitura, pois temos trabalhado de todas as formas para equilibrar as contas municipais, com responsabilidade e compromisso público. Esse equilíbrio, importante ressaltar, é que nos permite fazer cada vez mais entregas para a nossa população. Essa conquista, no entanto, veio acompanhada de um sabor amargo.


Nas últimas semanas, temos aprofundado a análise das contas municipais, inclusive pelo fato de estarmos no período de data-base dos municipários. Os dados mostram que, apesar de todos esses esforços de gestão, somos reféns de um sistema nacional de repartição tributária absolutamente injusto com os municípios e que pune o povo brasileiro. Além de ficar com a menor fatia do bolo tributário, somos surpreendidos por decisões dos três poderes do ente federal que solapam os cofres municipais, pois reduzem receitas sem aviso prévio e sem planejamento. Ao mesmo tempo, essas decisões, muitas delas movidas por interesses políticos e eleitorais, na maioria das vezes, criam novas despesas. Os gestores municipais precisam fazer frente a uma equação praticamente impossível: como fazer mais com cada vez menos.

Esse cenário assombroso não se abate sobre os gestores municipais apenas, mas sobretudo sobre os cidadãos que contribuem, que vivem nos municípios e que esperam e merecem boas políticas públicas. Aliás, os mais impactados são justamente aqueles que mais dependem do Estado, as fatias da população mais vulneráveis, aquelas dependentes de políticas públicas de saúde, de educação, de assistência social, frontalmente atingidas por esse sistema absolutamente obtuso, torto e insustentável.

Em Pelotas, entre agosto de 2022 e agosto de 2023, perderemos um total de R$ 104 milhões da nossa receita prevista e organizada num planejamento orçamentário muito criterioso. Ao mesmo tempo, temos novas despesas à vista, como o piso da enfermagem e outros que tramitam no Congresso Nacional. Temos a exigência de universalizar as vagas de educação infantil, recentemente determinada pelo Supremo Tribunal Federal. O sistema único de saúde está cada vez mais demandado, justamente pelas consequências da pandemia. Está se formando, num horizonte muito próximo, uma tempestade perfeita.


Não se trata, como eu disse recentemente, de uma charada ou de uma corrida de obstáculos. Também não é um choro de prefeitos, cuja porta é a mais próxima para que a população bata e reivindique melhorias. A grande maioria das pessoas vive nas cidades. Estamos falando da vida real do povo brasileiro. É preciso um basta! Chegamos a um dilema nacional: ou a sociedade compreende e reage para transformar esse sistema falido e viciado, ou a vida de todos ficará cada vez mais difícil. A reforma tributária que se avizinha talvez seja o momento para rever tudo isso, desde que a sociedade esteja alerta e cobre firmemente seus direitos.


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