Por Thaís Russomano
Médica especializada em Medicina Espacial

Não cheguei a conhecer Didi, a mãe da mãe de minha mãe, pois ela partiu deste mundo terreno anos antes de eu nascer. Ouvi, porém, muitas histórias sobre sua vida e vi fotos que sempre me impressionaram - uma senhora de cabelos brancos, olhar forte, expressão séria, vestidos pretos. Após a prematura morte do marido, a vó Didi, como ficou conhecida pelos descendentes, não coloriu mais as roupas, em sinal de respeito e de saudade.

Uma das histórias da vó Didi muito me marcou. Por anos consecutivos, ela preparou um enxoval para sua primeira visita ao continente europeu. Com pragmatismo e determinação, buscava adquirir roupas para as temperaturas do outro lado do mundo, malas próprias para uma longa viagem e dinheiro suficiente para aproveitar o que os distantes países proporcionariam.

Segundo minha mãe, esse ritual se repetiu várias vezes. Vó Didi, porém, sempre via sua viagem transferida para uma outra ocasião, mesmo que longínqua. E assim foi. Os anos passaram mais depressa do que Didi pôde perceber e, em 1958, ela adoeceu, lutou em vão contra uma doença da vesícula biliar, que evolui mal, trazendo, como consequência, um derrame cerebral e complicações pulmonares - um quadro sem volta!

Assim, inevitavelmente, sempre que adio uma decisão, essa história me vem, como um filme antigo. E, confesso, um medo e uma desconfiança se apoderam de mim, tornando difícil deixar para fazer algo no futuro - próximo ou distante!

Espero que 2023 seja um ano cheio de importantes decisões e poucas postergações. Fico imaginando o que essa senhora de vestido preto e cabelos brancos pensaria ao ver que uma história sua serviu de lição para gerações futuras. Acho que ela concordaria que sonhos só valem a pena quando são capazes de cruzar a barreira da imaginação e enveredar realidade adentro.

2023 está aí! Se não for agora, então quando?​