Eduardo Ritter
Professor do Centro de Letras e Comunicação da UFPel
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Um dos princípios básicos da atividade jornalística, aprendidos no primeiro semestre do curso de Jornalismo, aborda os critérios que os jornalistas adotam para selecionar o que é notícia, chamados de valor-notícia ou critérios de noticiabilidade. Diversos autores apresentam critérios como ineditismo, proeminência, utilidade, atualidade, confronto, proximidade, etc. Estou pensando em defender, teoricamente, a inclusão de mais um: relacionamentos.

Relacionamentos amorosos dão Ibope. Seja na ficção, seja na realidade. Novelas, séries, filmes, livros, fofocas de vizinhos, enfim, lança-se um caso na mesa e ele rende. Um livro que trata bem da questão é Triângulo das águas, do Caio Fernando Abreu. A obra, vencedora do Prêmio Jabuti de 1984, conta com três novelas, porém, as duas primeiras são uma espécie de poesia em prosa. Em síntese, trata-se de um punhado de ideias e misticismos colocados em meio a acontecimentos confusos. Entretanto, a última novela, intitulada "Pela noite", que é a maior das três, possivelmente foi a responsável pela vitória de Caio no Prêmio Jabuti daquele ano.

Pois "Pela noite" trata justamente do tema relacionamento. A história é sobre dois caras que praticamente não se conhecem e que resolvem passar a noite juntos (conversando, passeando, e não fazendo aquilo que o malicioso leitorinho está pensando). O relacionamento entre eles acaba englobando questões que se aplicam a todos os tipos de casais, sejam homossexuais, heterossexuais, pansexuais, ou o que for. Enquanto um dos personagens viveu dois relacionamentos de longo prazo (um com uma moça, que durou seis anos, e outro com um cara, que durou dez anos), o outro nunca namorou firme com ninguém, sendo um legítimo "deixa a vida me levar", ficando, no máximo, um ou dois meses com a mesma pessoa. Apesar das diferenças, vai pintando um clima entre os dois, que começam a noite no apartamento de um deles, depois partem para um restaurante heterossexual e dali seguem para uma balada gay, onde segue a noite, vivida intensamente por ambos. Aliás, durante a saída, eles acabam vivendo várias etapas típicas de novos relacionamentos: descobertas mútuas, discussões, reflexões, ciúmes, brigas, cenas novelescas, silêncios, birras, etc. Em um breve momento de separação dos dois no meio da madrugada, um deles reflete:

"Desejou que ele estivesse logo de volta, para dizer coisas sem sentido, para se mexer, para ferir e ferir-se, para sorrir de lado, esfregar as mãos fazendo estalar as juntas dos dedos, uma saudade prévia, para ficar perto e fazê-lo rir de susto, de prazer, etc.".

Quando o tema é relacionamentos, aliás, Caio Fernando Abreu é mestre, sempre englobando sentimentos e relacionamentos que são comuns a todos os tipos de casos, namoros, ficadas, casamentos, separações, etc. E é por isso que ele é um escritor universal que pode ser uma das referências teóricas para esse novo/velho valor-notícia. Afinal, praticamente todo mundo em algum momento da vida acaba se metendo nessa barca, vivendo todos os tipos de dilemas, dramas, alegrias, paixões, humilhações, desejos, felicidades e tristezas que brotam quando duas almas resolvem entrelaçar corpos e corações.