Artigo

Possibilidade de inscrição dos contribuintes inadimplentes de IPTU no Serasa

Por Vilson Farias, doutor em Direito Penal e Civil, e escritor
Charles Jacobsen
, acadêmico de Direito

No dia 24 de novembro de 2023, a Prefeitura de Pelotas divulgou em seu site, por meio do Secretário de Fazenda Municipal, que havia mais de 250 mil inscrições e uma dívida total de aproximadamente R$ 78 milhões. Além disso, como medida para acelerar o plano de reequilíbrio das finanças municipais, ameaçou inscrever os inadimplentes no Serasa, gerando questionamento por parte da população acerca da legalidade da medida adotada.

Essa notícia causou preocupação entre os contribuintes, muitos dos quais não quitaram seus débitos devido a dificuldades de resolver as pendências pelo site municipal ou pessoalmente no órgão municipal. A irregularidade na conduta anunciada pela Prefeitura Municipal de Pelotas reside no fato de que o Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) é um tributo municipal, regulamentado pelo Código Tributário Nacional (CTN) em seus artigos 32 e 34. O tributo tem como base o imóvel e não a pessoa física, tornando inconstitucional a inscrição dos contribuintes em órgãos de restrição de crédito sem o devido processo legal e a oportunidade de contraditório.

Cabe ressaltar que o devido processo tributário delineia os ritos do processo civil, e toda dívida, antes de ser executada, deve ser regularmente inscrita na Certidão de Dívida Ativa (CDA). Somente após o esgotamento do prazo fixado para pagamento, estabelecido por lei ou decisão final em processo regular, o ente municipal adquire o direito de judicializar a cobrança dos tributos dos contribuintes. Os artigos 201 e 203 do CTN são esclarecedores quanto a esse procedimento.

Nesse contexto surge a dúvida de como é feito o cálculo do IPTU. No Município de Pelotas, o IPTU é calculado pela aplicação de uma alíquota percentual sobre o valor de mercado do imóvel. Exemplo: uma casa que vale R$ 200 mil tem alíquota de 1% para o IPTU. Então a base de cálculo do imposto são os R$ 200 mil. Para saber o valor do imposto devido, calcula-se o valor de 1% de 200 mil, que resulta em R$ 2 mil. Portanto, está casa deve pagar R$ 2 mil por ano de IPTU.

Um caso semelhante ocorreu em Tietê, no Estado de São Paulo, onde a Prefeitura buscou adotar a mesma medida para pressionar os contribuintes a acelerarem o pagamento de seus débitos, violando o direito constitucional ao devido processo legal e ao contraditório.

Diante desse contexto, torna-se evidente que a medida adotada pela Prefeitura de Pelotas visa violar o devido processo legal, utilizando-a como instrumento para equilibrar as finanças municipais sem considerar os direitos dos contribuintes. Além disso, essa ação pode gerar um cenário semelhante ao ocorrido em Tietê, onde foram ajuizados pelo contribuinte diversas ações judiciais contra a conduta irregular da fazenda municipal. Lá, a prefeitura quando chamada a juízo, escolheu o acordo conciliatório e acordou com todos contribuintes que ingressaram - judicialmente, e, por isso não ocasionou decisão de mérito pelo poder judiciário.

É imprescindível ressaltar que a eventual inscrição irregular do contribuinte no Serasa, sem a devida citação e o correto processo de Execução Fiscal, configura danos morais "in re ipsa", ou seja, decorrentes diretamente do próprio fato. Vale destacar que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já emitiu decisões a respeito desse tema, afirmando que embora a inclusão de inadimplentes no Serasa seja legal, isso deve ocorrer apenas após o devido processo legal estabelecido pela Lei de Execução Fiscal.

Por fim, em face de toda a exposição anterior, é crucial enfatizar que o CTN tem como princípio a vedação ao confisco, ou seja, o Município não pode utilizar dessa medida, sem o devido processo e atos anteriores, caso contrário, configuraria caráter confiscatório no intuito de compelir o pagamento do imposto. Dessa forma, o contribuinte não deve ser prejudicado pelas medidas adotadas para reequilibrar as finanças municipais, o direito ao devido processo legal, especialmente nos trâmites da execução fiscal, que inclui ampla defesa e contraditório, é inalienável e não pode ser arbitrariamente negado pelo Município. Este princípio constitucional visa assegurar que nenhum indivíduo seja privado de seus direitos sem a observância de um procedimento justo e legal, inclusive no contexto das questões tributárias.


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