Eduardo Allgayer Osorio
Sobre a posse da terra pelos povos originais
Eduardo Allgayer Osorio
Engenheiro agrônomo, professor titular da UFPel, aposentado
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É consenso que o ser humano se originou na África, migrando para o Oriente Médio e daí para a Europa e para a Ásia, de onde alcançou as Américas, chegando ao Brasil. Em cada local onde os recém-chegados se instalaram, foram subjugados por outros que ali aportavam, em sucessivas guerras de conquista. Hoje, dos oito bilhões de pessoas espalhadas sobre a Terra, apenas 5% descende diretamente dos povos originais. Nos Estados Unidos, os povos indígenas perfazem menos de 3% da população. No Canadá, menos de 2% e no México perto de 15%. Na Austrália os aborígenes somam menos de 1% e na Nova Zelândia os maoris representam 15%.
Nesses e em outros países o direito dos povos originais às terras ocupadas por seus ancestrais restringe-se à outorga de uso em espaços restritos, sem conflitos importantes pela posse da terra. A título de exemplo, analisemos o ocorrido na Espanha. Povoado originalmente por fenícios provenientes da atual Tunísia, no século 8, o país foi invadido pelos mouros provenientes da região africana onde hoje se situam o Marrocos e a Argélia, tendo aí permanecido durante sete séculos, até serem expulsos definitivamente em 1492. Pergunta-se: esse acontecimento dá aos imigrantes tunisianos, marroquinos e argelinos que hoje aportam à Espanha como imigrantes o direito de reivindicar as terras que seus ancestrais ocuparam durante 700 anos?
No Brasil, as áreas demarcadas onde vivem os povos originais perfazem 14% do território nacional, mais do que as superfícies territoriais da Inglaterra, França e Itália somadas. Não obstante o STF, em sua sanha por reescrever a Constituição Federal propôs-se a reavaliar o Marco Temporal das Terras Indígenas, com forte tendência a derrubá-lo, abrindo espaço para novas demarcações que poderão dobrar a vasta área hoje ocupada pelos índios, desconsiderando a decisão propalada em 2009 pelo próprio STF no julgamento da terra Raposa Serra do Sol, quando aprovou o parecer do ministro Carlos Ayres Britto: "condicionando a legitimidade das demandas territoriais indígenas à sua presença física nos territórios a serem demandados por ocasião da promulgação da Constituição Federal", estabelecendo "um marco objetivo que refletisse o propósito constitucional de colocar uma pá de cal nas intermináveis discussões sobre a ocupação de terras indígenas".
No julgamento dos recursos interpostos na época, o ministro relator Luís Roberto Barroso propalou o parecer de que "a Constituição Federal trabalhou com data certa, a da promulgação dela própria, como insubstituível referencial para a ocupação de um determinado espaço geográfico por essa ou aquela etnia aborígene". Mas agora a conversa mudou, sob o argumento de que "a posse não é só física, já que para os índios estar numa terra tem um sentido anímico" e outras abstrações. Visando regular o tema, a Câmara de Deputados aprovou, por 324 votos a 131, um projeto de lei reiterando que "os povos originários só terão direito a demarcar as terras que tiverem a posse em 1988". Encaminhado ao Senado, o presidente Pacheco, na expectativa de ser indicado por Lula para o cargo de ministro do STF, "sentou em cima", trancando o andamento do projeto. E o pior é que, mesmo aprovado no Senado, poderá ser vetado pelo presidente da República e, derrubado o veto, ainda caberá recurso ao STF sobre a sua constitucionalidade.
Portanto, fique alerta. Como os índios antes de 1500 ocupavam todo o território nacional, aprovado o que está em andamento eles poderão pretender a posse do local onde você habita, reiterando vivermos hoje um estado de insegurança jurídica que sequer assegura a posse da sua propriedade.
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