Sergio Cruz Lima
Jean Genet, o "Santo"
A vida de Jean Genet, um parisiense nascido no início do século 20 e figura de proa no teatro de vanguarda da França, começa mal e acaba muito pior. Filho ilegítimo, abandonado pela mãe e criado em um orfanato, vive em lar adotivo e em reformatório de jovens. Larápio profissional e orgulhoso disso, passa muitos anos de sua vida transitando de prisão em prisão.
Aos 20 anos, encontramo-lo sobrevivendo graças à sua própria astúcia, perambulando pela Europa como mendigo, ladrão, batedor de carteiras, traficante de drogas e prostituto, experiência sobre a qual se vangloria no livro Diário de um ladrão, escrito em 1949. Nele, escreve: "Embora a santidade seja o meu objetivo, não consigo dizer do que se trata. Meu ponto de partida é o próprio mundo, que indica o estado mais próximo à perfeição moral. Da qual não sei nada, a não ser que sem ela minha vida seria em vão. Incapaz de chegar a uma definição de santidade - tão incapaz quanto de encontrar uma definição de beleza -, quero criá-la a todo momento, isto é, agir de tal forma que tudo o que faço possa me conduzir ao que me é desconhecido, para que a cada momento eu possa ser guiado pela busca da santidade até o tempo em que me tornar tão luminoso que as pessoas dirão 'É um santo', ou mais provavelmente, 'Ele foi um santo'".
É na cadeia que Genet escreve Notre-Dame des Fleurs, em 1943, no qual celebra o submundo do crime, e Le milagre de la rose, escrito três anos depois, no qual descreve o reformatório de Mettray onde passa parte da adolescência antes de fugir para inscrever-se na Legião Estrangeira, da qual logo há de desertar. Mais tarde, o autor retorna à dramaturgia, em peças nas quais explora as questões de identidade e o apetite humano para interpretar papéis, temas que encantam Ionesco e Samuel Beckett. Sartre e Cocteau elogiam-no. François Mauriac o descreve como "um esquilo aprisionado nas masmorras de um vício do qual não consegue escapar". Em 1948, quando novamente condenado por roubo, ameaçado de prisão perpétua, escritores famosos intercedem e Genet é indultado.
Sua obra é difícil. Descritas como "teatro do ódio", suas peças teatrais pretendem chocar. E chocam. O autor, ao mesmo tempo consegue explicitar sua criminalidade e grande sexualidade - e uma preocupação com o assassinato e mortes violentas -, aliada à religiosidade e sua luta pela "santidade" por meio da degradação e da humilhação. Ao repudiar o mundo burguês que o rejeitara, escreve sobre criminosos como vítimas da sociedade. Assim acontece em Le balcon, cujo cenário é um bordel no qual os clientes assumem os papéis de sua fantasia, e Les nègres, peça escrita para atores negros e que culmina com o estupro e morte de uma mulher branca. No fim de sua vida, Jean Genet vive um tempo com os Panteras Negras, na América, e com os militantes do Movimento pró-libertação da Palestina. Morre em Paris, em 1986, aos 76 anos.
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